quinta-feira, 7 de junho de 2012

                                   A EDUCAÇÃO DOS SENTIMENTOS

A palavra educação vem do latim educare ou educere. Provérbio: e, verbo ducare, ducere. Significa ato de educar; conjunto de normas pedagógicas aplicadas ao desenvolvimento geral do corpo e do espírito.Promover educação; transmitir conhecimentos; ensejar condições para o educando modificar para melhor.

Hippolite Leon Denizard Rivail, eminente pedagogo francês (1857) nos esclarece que:
“A educação, se for bem compreendida, será a chave do progresso moral. Quando se conhecer a arte de manejar os caracteres como se conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas. Essa arte, porém, exige muito tato, muita experiência e profunda observação”.

Ainda somos os grandes desconhecidos de nós próprios. Os nossos sentimentos, emoções, pensamentos, atrações, repulsas, simpatias e antipatias manifestam-se ainda de forma incompreensível e sem controle, dificultando as nossas relações intra e interpessoais. Os erros alheios são visíveis aos nossos olhos, contudo,e os nossos defeitos e tendências negativas, são devidamente observadas por nós?

Sentimentos são estados afetivos produzidos por diversos fenômenos da vida intelectual ou moral. Podem resultar de percepções sensoriais ou representações mentais. Como nos explica Jolivet (1964) emoção é um fenômeno afetivo complexo, provocado por um choque brusco e compreendendo um abalo mais ou menos profundo na consciência. C.Lahr (1964) também explica que emoção é o estado afetivo intenso muito complexo proveniente da reação ao mesmo tempo mental e orgânico do indivíduo todo, sob a influência de certas excitações internas ou externas, pois, nisto se vê a diferença existente com o termo sentimento.

Enquanto nos comprazemos nas paixões, reincidindo nos erros, numa atitude desatenta quanto aos aspectos que necessitam ser modificados ou burlados na nossa intimidade, enfrentaremos angustias e conflitos existenciais. As oportunidades do aprendizado na convivência com o próximo e consigo mesmo não devem ser desperdiçadas.
O conhece-te a ti mesmo, conforme nos ensinou um sábio da antiguidade (Sócrates), será o meio mais
prático de transformação interior.

Quando por livre e espontânea vontade, não nos dispomos a enveredar neste processo de autoconhecimento, buscando identificar o porquê das nossas reações aos fatores externos no relacionamento social, somos impulsionados pelos entre-choques sociais com aqueles do nosso convívio (família, trabalho, transportes coletivos, locais públicos) a nos conhecer. Aprendemos muito na convivência social, através de nossas reações com o meio e as manifestações que o meio nos provoca, atingindo-nos emocionalmente. No convívio com o próximo, aprendemos a identificar nossas reações de comportamento e a discipliná-las. O conhecer-se é o próprio processo de auto-conscientização do reconhecimento de nossas limitações e da mobilização de esforços em superá-las.
A regra universal de conduta nas ações já nos foi dita “Fazer ao próximo o que gostaríamos que o próximo nos fizesse”. Os nossos pensamentos, sentimentos, palavras, ações refletem as crenças, valores, visão de mundo internalizadas através da educação.
A educação dos sentimentos que geram estados de sofrimentos possibilitará alcançar uma maior compreensão quanto às suas origens, causas e consequências. Relacionaremos a seguir (Ney Prieto Peres), alguns sentimentos de conotação perturbadora e como eles se manifestam no nosso cotidiano:

                                                                         Orgulho
“O orgulho vos induz a julgardes mais do que sois, a não aceitar uma comparação que vos possa rebaixar, e a vos considerardes, ao contrário, tão acima dos vossos irmãos, quer em espírito, quer em posição social, quer mesmo em vantagens pessoais, que o menor paralelo vos irrita e aborrece. e o que acontece, então? entregai-vos á cólera”.

Principais reações e características do tipo predominantemente orgulhoso:
- Amor próprio muito acentuado: contraria-se por pequenos motivos;
- reage explosivamente a quaisquer observações ou críticas de outrem em relação ao seu comportamento;
- necessita ser o centro de atenções, fazer e prevalecer sempre as suas próprias idéias;
- não aceita a possibilidade de seus erros, mantendo-se num estado de consciência fechado ao diálogo
construtivo;
- menospreza as idéias do próximo;
- ao ser elogiado por quaisquer motivos, enche-se de uma satisfação presunçosa, como que se reafirmando na sua importância pessoal;
- preocupa-se muito com a sua aparência exterior, seus gestos são estudados, dá demasiada importância à sua posição social e ao prestígio pessoal;
- acha que todos os seus circundantes (familiares e amigos) devem girar em torno de si;
não admite e humilhar diante de ninguém, achando essa atitude um traço de fraqueza e falta de
personalidade;
- usa da ironia e do deboche para com o próximo nas ocasiões de contenda.

                                                               Vaidade
A vaidade é decorrente do orgulho, e dela anda próxima. A vaidade, nas suas formas de apresentação, quer pela postura física, gestos estudados, retórica no falar, atitudes intempestivas, reações arrogantes:
Principais reações e características do tipo predominantemente vaidoso:
- Apresentação pessoal exuberante (no vestir, nos gestos afetados, no falar demasiado;
-evidência de qualidades intelectuais, não poupando referências à própria pessoa, ou a algo que realiza;
- esforço em realçar dotes físicos, culturais ou sociais com notória antipatia provocada aos demais;
- intolerância para com aqueles cuja condição social ou intelectual é mais humilde, não evitando a eles referências desairosas;
- aspiração a cargos ou posições de destaque que acentuem as referências respeitosas ou elogiosas à sua pessoa;
- não reconhecimento de sua própria culpabilidade nas situações de descontentamento diante de infortúnios por que passa;
- obstrução mental na capacidade de se auto-analisar, não aceitando suas possíveis falhas ou erros,
culpando geralmente a sorte, a infelicidade imerecida, o azar.

                                                             Inveja
A inveja reflete a fragilidade em que vivemos, deixando-nos consumir em desejos inconsistentes e ilusórios.
Principais reações e características do tipo predominantemente invejoso:
- Não aceitação da condição relativamente superior de alguém, ou de uma situação de vida de outrem
melhor que a sua, leva à incornformação, ao ódio, procurando ferir e destruir o objeto da inveja;
- desejo manifestado dentro de nós de possuir algo que vemos em alguém ou na propriedade de alguém;
- crítica a alguém que pouco faz e muito possui, comparando sua posição com os sacrifícios que a vida nos apresenta;
- estados de depressão, causando tristeza, sofrimento, inconformidação e revolta com a própria sorte;
- sentimento penetrante e corrosivo que emitimos quando assim olhamos para alguém, nos deixando
entregues a ódios infundados, por deterem o que ambicionamos;
- sentimento destruidor da resignação, da tolerância e da resignação;
- resultado do apego aos valores transitórios: posição social, objetos de uso pessoal, bens materiais, recursos financeiros.

                                                              Ciúme
O ciúme anda próximo da inveja. ambos são expressões da cobiça, e se manifestam no nosso desejo de posse ou na nossa condição possessiva, ambiciosa, egoísta. Quando o ciúme se refere às pessoas do nosso relacionamento, é indício da paixão, do amor ainda condicionante, dominante, restritivo, exclusivista. O ciúme impõe condições. é assim que quase sempre se origina a inconformação, o desespero, o desentendimento.

                                                                Avareza
A avareza diz respeito igualmente ao apego específico ao dinheiro e aos objetos materiais que possuímos. O homem avaro é o egoísta que nega o auxílio pecuniário a quem lhe bate à porta, desprezando as oportunidades de servir e até mesmo de ouvir quem lhe venha pedir socorro. O avaro centraliza sua preocupação na aquisição do dinheiro ou nas diversas formas de enriquecimento. Para ele, o objetivo principal da existência é o dinheiro e que ele lhe proporciona para usufruto. O zelo demasiado quando relutamos em emprestar algumas das nossas quinquilharias, com receio de perdê-las ou desgastá-las, é uma forma de avareza, como também um aspecto de ciúme. A mania de guardar por tempo indeterminado, até mesmo sem usar jóias, roupas ou outros pertences pessoais, reagindo em dar a alguém que mais necessite.

                                                                Ódio
O ódio é uma manifestação dos mais primitivos sentimentos do homem animal, que ainda guarda no espírito em evolução dos resquícios do instinto de conservação, sob as formas de defesa, de amor-próprio. O ódio se manifesta desde os aspectos mais sutis, dissimulado na hipocrisia social e nas formas de antipatias, aos atos mais cruéis e brutais de violência. O ódio se apresenta como um sentimento, uma emoção incontida, um impulso que, ao nos dominar, expressamos através de palavras ofensivas, quando contraímos o coração, cerramos os maxilares, fechamos os punhos e soltamos faíscas vibratórias de baixo padrão, sintonizados com as entidades malévolas, que assim podem nos envolver, instigando-nos até ao crime. Os ódios são despertados pelas humilhações sofridas, ou quando injustiçados, maltratados, traídos no afeto, na confiança ou quando ofendidos. Junto ao ódio encontramos o rancor, que é a permanência dele, nas promessas feitas anós mesmos de revide. a vingança é sua decorrência.
                                                               
                                                                Personalismo
O egoísmo se funda na importância da personalidade.
Principais reações e características do tipo predominantemente personalista:
- Suas opiniões ou pontos de vista são sempre os certos e os que devem prevalecer aos dos demais;
- as experiências próprias são aquelas que servem de referência a resultados que se discutem com outros, desconsiderando em igual importância as experiências do próximo;
- na condição de subalterno, nega-se à colaboração de um plano ou projeto quando sua idéia ou parecer não e aceito numa escolha em grupo;
- melindra-se na sua auto-importância quando não convidado a participar com destaque nas decisões
relativas a empreendimentos do círculo que frequenta, muitas vezes até afastando-se ou ameaçando afastarse de suas funções;
- sente-se valorizado quando nas funções de comando e dificilmente aceita ser conduzido pela direção de outrem;
- aborrece-se facilmente quando contrariado nos seus desejos ou idéias;
- num trabalho para obtenção de um resultado comum, acha ou agem como se pudesse dispensar a
cooperação dos demais integrantes;
- teimosia e birra, revivendo questões ultrapassadas e contendas já superadas, onde sua opinião não foi seguida.
                                                                     
                                                                 Intolerância
- O intolerante não perdoa, nem mesmo atenua as falhas humanas e, por isso, falta-lhe a moderação nas apreciações para com o próximo; vê apenas o lado errado das pessoas, o que em nada estimula o bem proceder; é a qualidade do indivíduo intransigente.

Principais reações e características do tipo predominantemente intolerante:
- Austeridade para com o comportamento ou para com as obrigações dos outros, nas situações familiares, profissionais ou sociais de um modo geral;
- severidade exagerada quando nas funções de mando, perdendo quase sempre o controle emocional e
repreendendo violentamente algum subalterno que tenha cometido certo erro em suas obrigações de serviço;
- rigidez nas determinações ou nas posições tomadas em relação a alguma penalidade aplicada a alguém que tenha errado e sobre quem exerça autoridade;
- rispidez e maus-tratos para com aqueles com quem convive, agindo com dureza e radicalidade;
-não-aceitação e incompreensão das infrações que alguém possa cometer, condenando-as inapelavelmente com julgamentos agressivos e depreciativos;
- prazer em denegrir as pessoas, evidenciando, de preferência, seus defeitos.

                                                                      Impaciência
O indivíduo impaciente é tipicamente nervoso, apressado.
Principais reações e características do tipo predominantemente impaciente:
-Inconformação: não-aceitação do desejo que não realizou;
- precipitação: não faz por esperar a ocasião precisa;
- inquietação : não se acalma quando tem que aguardar;
- agitação: desespero pelas frustrações sofridas;
- sofreguidão: angústia, ansiedade por algo que tanto quer;
- impertinência: teimosia, insistência intranquila;
- irritação: contrariedade por algum não conseguido;
- aborrecimento: não-realização daquilo que queria.
A compreensão do significado desses sentimentos, identificando como eles se manifestam no nosso ser,
torna-se um passo imprescindível para a mudança comportamental e consequente melhoria das nossas
relações intra e interpessoais.
Dentre as competências necessárias ao Ouvidor, as habilidades humanas são fundamentais para o desempenho de suas funções. Compreenda-se por habilidades humanas a capacidade de se comunicar, de compreender o comportamento humano e desenvolver uma liderança eficaz.
Sendo a Ouvidoria um canal de comunicação direta entre o cidadão e o Poder Público, relacionaremos a seguir, alguns atributos profissionais que caracterizam o perfil de um Ouvidor:
. Ser imparcial;
. adotar uma postura mais pedagógica e propositiva do que contestatória, apresentando ao cidadão os seus direitos e deveres;
. ter poder de negociação, para administrar conflitos;
. ter representatividade, tanto interna quanto externa;
. ter boa comunicação e relacionamento interpessoal;
. possuir, sobretudo, bom senso.
Comunicação, segundo Luiz Iasbeck, “é compartilhar sentimentos, temores, humores, angústias e surpresas, é estar junto, pertencer, vincular, estar afetado e em afeto com quem nos cerca”.

Na comunicação verbal, devemos evitar:
. Pronunciar mal as palavras;
. falar muito baixo ou muito alto;
. falar muito depressa ou muito devagar;
. respirar mal;
. usar a comunicação como forma de poder;
. esquecer o valor da empatia;
. ser irônico e sarcástico;
. ter gestos, atos e palavras incoerente;
. ser inflexível;
. falar do que não conhece;
. expressar-se sem objetividade e clareza;
. não aliar a técnica à naturalidade na comunicação;
. gestos que conotem nervosismo e inibição, etc.
No cotidiano do Ouvidor, ele lida com situações de angústias e conflitos, exercitando-se na arte de ouvir as pessoas e sobretudo, na condição de vivenciar a empatia. Empatia é a capacidade de se colocar no lugar da outra pessoa, de entender o seu estado de espírito.
Ouvir significa ter paciência e tolerância para aceitar a outra pessoa como ela é, com suas qualidades e defeitos, crenças e emoções, sem pré-julgamentos.
O conflito surge quando há a necessidade de escolha entre situações que podem ser consideradas
incompatíveis. Todas as situações de conflito são antagônicas e perturbam a ação ou a tomada de decisões por parte da pessoa ou de grupos. É um fenômeno subjetivo e de difícil percepção.
Segundo estudo de psicólogos especialistas em relacionamento humano, a eficiência em lidar com outras pessoas é muitas vezes prejudicada pela falta de habilidades, de compreensão e de trato interpessoal. As pessoas que têm mais habilidades em compreender os outros e têm traquejo interpessoal são mais eficazes no relacionamento humano.
Assim, através da educação dos nossos próprios sentimentos, sejamos ouvidores ou não, estaremos desenvolvendo habilidades necessárias, alcançando o equilíbrio entre o pensar, sentir e agir e conseqüentemente, melhorando as nossas relações humanas e profissionais.


Karla Júlia Marcelino
Ouvidora Geral do Estado de PE
Presidente da Seccional de PE

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