quinta-feira, 28 de julho de 2016

O BUDISMO, A MENTE, O BRASIL E O MUNDO
Por Alan Wallace
 
“Precisamos urgentemente de uma alternativa para o nosso atual modo materialista de ver a existência humana e a realidade como um todo,juntamente com sua ênfase no hedonismo e no consumismo, pois o próprio destino da civilização humana e o equilíbrio do ecossistema dependem da nossa re-concepção do significado da ‘boa vida’."
 
“Devemos fazer tudo para alcançar o equilíbrio”
 O professor B. Alan Wallace, PhD, é um grande erudito e um dos mais prolíficos escritores e tradutores do budismo tibetano no Ocidente. A seguir, uma entrevista, onde Alan Wallace fala sobre os estudos da mente na atualidade. Entrevista de Alessandra Cavalheiro. Tradução: Cerys Tramontini, antes da visita do professor a Florianópolis, em fevereiro de 2016. Foto Luiz Bettoni, Templo Caminho do Meio, Viamão-RS, CEBB – Centro de Estudos Budistas Bodisatvas.
 “Precisamos urgentemente de uma alternativa para o nosso atual modo materialista de ver a existência humana e a realidade como um todo,juntamente com sua ênfase no hedonismo e no consumismo, pois o próprio destino da civilização humana e o equilíbrio do ecossistema dependem da nossa re-concepção do significado da ‘boa vida’.”
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ENTREVISTA
1 – Sabemos que você veio para Florianópolis convidado pelo Instituto Paz e Mente, que fundou o primeiro programa de pós-graduação em Transformação de Conflitos e Estudos de Paz no Brasil, com base no equilíbrio emocional. Como você vê este programa e qual a sua importância para a sociedade brasileira?
 A civilização moderna está enfrentando muitos desafios sem precedentes e, a fim de darmos conta dessa situação, temos de fazer tudo o que pudermos para alcançar níveis ideais de equilíbrio mental e bem-estar interior, tanto para nós como para nossos filhos. O Instituto Paz e Mente é dedicado a fazer todo o possível a este respeito, para preparar as pessoas para um modo de vida em que todos nós possamos ser agentes de paz e reconciliação em um mundo em que há tanto conflito e miséria. Portanto, este é verdadeiramente um grande serviço ao povo do Brasil e do mundo em geral.
 
 
 2. Como têm sido os avanços dos estudos da mente nos últimos anos, dentro das universidades?
 Embora alguns avanços tenham sido feitos nos últimos 135 anos, sobre o estudo científico da mente, ele tem sido bastante limitado pelas restrições ideológicas e metodológicas do materialismo científico. De acordo com essa forma reducionista de lidar com a mente, a abordagem radicalmente empírica de Galileu e Darwin (de observar cuidadosamente os fenômenos que buscam compreender) tem sido suprimida pela insistência dogmática de que a mente seja estudada apenas indiretamente, através de seus correlatos neurais e expressões comportamentais. Enquanto a física passou por duas revoluções nos últimos 400 anos e a biologia conquistou uma grande revolução, o dogma do materialismo científico atrapalhou a realização de uma verdadeira revolução nas ciências da mente. Para romper essa barreira ideológica, métodos devem ser introduzidos na psicologia, para aperfeiçoar as nossas habilidades de atenção e de introspecção, de modo que os processos mentais e estados de consciência possam ser observados diretamente, e com um alto grau de sofisticação, e as descobertas replicáveis possam ser feitas. Pressupostos reducionistas podem ser desafios.
 
 
 3 – Como você vê a evolução de práticas contemplativas no Brasil, em nosso país, que é considerado o país do Carnaval?
 Durante minhas muitas visitas ao Brasil ao longo dos últimos dez anos, tenho o prazer de ver o grau de abertura para práticas contemplativas, tanto no público em geral quanto no meio acadêmico. Este é um dos mais diversos países que visitei, com muitos grupos étnicos e crenças, e isso tem sido útil na prevenção de qualquer ideologia de dominação, que suprimiria todas as outras.
4 – Como esta ciência contemplativa, que vem dos Himalaias, pode ajudar a nossa sociedade a tornar-se mais pacífica? Quais são as contribuições que esta ciência pode oferecer para as sociedades ocidentais?
 Na verdade, a ciência contemplativa ministrada no Instituto Paz e Mente tem suas raízes em múltiplas culturas de toda a Ásia, não apenas nas regiões nômades dos Himalaias. Assim, as pessoas que praticam essa ciência contemplativa incluem pessoas da cidade, agricultores, comerciantes e nômades. Estas culturas tradicionais valorizam o bem-estar e a paz interior juntamente com prosperidade exterior, de modo que eles não repousaram seu foco unicamente em aquisição e consumo desenfreados. Precisamos urgentemente de uma alternativa para o nosso atual modo materialista de ver a existência humana e a realidade como um todo, juntamente com sua ênfase no hedonismo e no consumismo, pois o próprio destino da civilização humana e o equilíbrio do ecossistema dependem da nossa re-concepção do significado de “boa vida”. Neste sentido, as culturas mais tradicionais têm muito a nos ensinar sobre desenvolver contentamento, harmonia e paz com o resto do mundo.
 
 
 5. Muitos de nós compreendemos o budismo como religião. Eu lhe pergunto: o que é o budismo? É uma religião ou não?
 As categorias de religião, filosofia e ciência são construções eurocêntricas que se aplicam bem ao Judaísmo, Cristianismo e Islamismo como religiões, Platão, Spinoza, Kant como filósofos, e à física, biologia e psicologia como ciências.Mas as tradições como o budismo, que originou e se desenvolveu fora da influência da civilização eurocêntrica, não são facilmente classificados dentro deste quadro ocidental. O budismo tem elementos religiosos, filosóficos e científicos, mas também tem elementos únicos que não são encontrados em qualquer lugar na civilização ocidental. Estes elementos, incluindo uma rica herança sobre a investigação contemplativa, devem ser examinados com muito cuidado, pois eles podem contribuir grandemente para a civilização humana, neste momento de grande necessidade que estamos passando.
 
 
 6. Sua Santidade Dalai Lama mencionou em uma entrevista que o budismo não é uma religião. Ele diz que o budismo pode ser uma ciência da mente e que as pessoas não precisam ser budistas para praticar a ciência da mente. O que você pensa sobre isso? Como pode esta ciência ser colocada em nosso dia a dia?
 Budismo certamente inclui uma ciência da mente, e pode ser praticado por qualquer pessoa com uma mente aberta que queira explorar a natureza e os potenciais da mente e maneiras de conseguir um estado excepcional de saúde mental, equilíbrio e bem-estar. Muitas das teorias e métodos do budismo são acessíveis a pessoas de todas as crenças religiosas e para as pessoas seculares, porque não exigem a adesão a qualquer sistema de crença, mas sim encorajar-nos a explorar nossas mentes e a realidade em geral, com uma mente aberta.
 
 

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