sábado, 31 de agosto de 2019

POSSIBILIDADES E DESAFIOS DAS OUVIDORIAS NO ENFRENTAMENTO DE DENÚNCIAS DE ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO 

Karla Júlia Marcelino



Resumo 

Este artigo tem por objetivo analisar as possibilidades e desafios das Ouvidorias frente ao Assédio Moral no ambiente de trabalho. Para tanto, fizemos uma revisão bibliográfica sobre o tema. As relações de trabalho nesta era “globalizada” caracterizam-se pela sua crescente desumanização. O ambiente de trabalho deveria proporcionar o desenvolvimento intelectual e um nível de satisfação crescente do trabalhador, o qual, estimulado pelas habilidades humanas de seus gestores, encontraria na organização os fatores motivacionais propícios ao atingimento de metas e realização profissional. As Ouvidorias possibilitam a intermediação entre o cidadão e a gestão do órgão, quando conseguem identificar nas denúncias recebidas as características dos casos de Assédio Moral, esclarecendo devidamente o denunciante quanto aos procedimentos cabíveis. 

Palavras-chave: Assédio Moral. Gestão. Ouvidoria.

Abstract 
This article aims to analyze the possibilities and challenges of the Ombudsman’s Offices in the workplace in the face of moral harassment. To do so, we did a bibliographic review on the subject. Labor relations in this “globalized” era are characterized by their increasing dehumanization. The work environment should provide intellectual development and a level of worker satisfaction that, stimulated by the human skills of its managers, would find in the organization motivational factors conducive to achievement of goals and professional achievement. The Ombudsman’s Offices allow the intermediation between the citizen and the management of the organ, when he can identify the characteristics of the cases of moral harassment in the complaints received, duly clarifying the complainant as to the appropriate procedures. Keywords: Moral Harassment. Management. Ombudsman’s Office. 



INTRODUÇÃO 

O Clima Organizacional deve refletir a atmosfera psicológica dos funcionários, cujo compartilhamento de informações e relações humanas fundamentadas em valores morais e éticos influenciam diretamente a motivação, a efetividade e o compromisso desses trabalhadores. Contudo, observa-se uma crescente degradação das relações de trabalho, havendo predominância pela impessoalidade e competição nas relações interpessoais. Na pactuação de metas organizacionais nem sempre se leva em consideração a capacidade de produção de suas equipes. 

Embora o trabalhador seja o capital intelectual de uma Organização, ele é facilmente descartável, quando a própria Organização apropria-se de sua produção e rapidamente o substitui por um novo funcionário com remuneração mais baixa e lucrativa. Valores como lealdade, compromisso, solidariedade, fraternidade e humanidade são rapidamente substituídos pelos resultados alcançados e capacidade de competir. Porém, as habilidades técnicas e conceituais não são suficientes para que um gestor seja um verdadeiro líder. A liderança não se institui através de decretos ou portarias. As habilidades humanas são fundamentais no ato de gerir. 

Segundo RABAGLIO (2008, p. 9), “Gestão é o ato de gerir, de administrar. São os meios através dos quais se gerem uma equipe, uma instituição, um projeto ou uma empresa”. Ainda segundo FLEURY (2001, p.185), “a noção de competência aparece assim associada a verbos como: saber agir, mobilizar recursos, integrar saberes múltiplos e complexos, saber aprender, saber engajar-se, assumir responsabilidades, ter visão estratégica”. 

CHIAVENATO (2007, p. 69) nos fala que, para o alcance dos resultados, o gestor precisa desenvolver competências fundamentais: conhecimento, habilidades, julgamento e atitudes. 
- Habilidades técnicas consistem em utilizar conhecimentos, métodos, técnicas e equipamentos necessários para a realização de tarefas específicas como base em seus conhecimentos e experiência profissional [...] As habilidades humanas: consistem na capacidade e no discernimento para trabalhar com pessoas e, por intermédio delas, saber comunicar, compreender suas atitudes, motivações e desenvolver uma liderança eficaz [...] As habilidades conceituais: consistem na capacidade de lidar com ideias e conceitos abstratos. Essa habilidade permite que o administrador faça abstrações e desenvolva filosofias, valores e princípios de ação. 

Nesta era de competição predatória, nossa saúde emocional vem sendo nocauteada por processos de: ansiedade, flutuação emocional, angústias, doenças psicossomáticas, individualismo, irritabilidade, Síndrome do Pensamento Acelerado, deterioração das relações sociais, dificuldade de trabalhar em equipe e cooperar socialmente. 

Ainda segundo CURY(2015, p. 81), “uma pessoa cartesiana, excessivamente lógica, que não admite falhas e erros, torna-se uma bomba para seu próprio cérebro, um carrasco de sua saúde emocional e um franco-atirador que mata a tranquilidade de seu cônjuge, de seus filhos, seus amigos, seus colegas de trabalho”. Estudos recentes realizados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que o assédio moral poderá se converter no principal problema do mundo globalizado, caracterizado como o “mal-estar na globalização”, atingindo o psicológico e o emocional dos cidadãos, podendo desencadear ondas de depressão, angústia e  outros danos psíquicos em expressivos segmentos de trabalhadores. 

O assédio moral configura-se nas situações sistemáticas e prolongadas de humilhação e perseguição a que são submetidos os trabalhadores no exercício de suas funções durante a sua jornada de trabalho. 

A lei estadual de Pernambuco nº 13.314/2007, em seu artigo 2º, define: [...] considera-se prática de assédio moral, no âmbito da Administração Pública, toda ação repetitiva ou sistematizada praticada por agente e servidor de qualquer nível que, abusando da autoridade inerente às suas funções, venha causar danos à integridade psíquica ou física e à autoestima do servidor, prejudicando também o serviço público prestado e a própria carreira do servidor público. 

A médica psiquiatra francesa Marie-France Hirigoyen (2002, p. 65), uma das mais importantes estudiosas do assunto em todo o mundo, identifica o Assédio Moral no trabalho como “qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...), que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho”. 

Na Cartilha de Assédio Moral, publicada pela Ouvidoria-Geral do Estado de Pernambuco (PERNAMBUCO, 2015), consta que O assédio moral constitui um dos temas que mais têm sido discutidos na atualidade, no que se refere ao trabalho e ao trabalhador, comprometendo a dignidade, as suas relações afetivas e sociais. 

É importante considerar que o assédio moral apresenta contornos especiais no serviço público, em razão da garantia da estabilidade do vínculo funcional. A falta de clareza e discernimento quanto às situações vivenciadas no ambiente de trabalho que se configuram como assédio requer uma maior divulgação do tema e possível prevenção. Acrescente-se, também, o receio de possíveis retaliações ou perseguições por parte das vítimas, quando elas denunciam a situação de assédio moral nas Ouvidorias. Em face da difusão dessa prática, é relevante que o tema seja discutido por toda a sociedade, especialmente pelos servidores públicos, constituindo-se as Ouvidorias num canal de intermediação desse processo. Assédio Moral é a exposição do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. Normalmente o assediador não escolhe o seu alvo de forma aleatória, mas sim devido ao fato de a vítima destacar- -se por possuir qualidades ou habilidades que ele não tem. 


No processo de identificação de Assédio Moral, serão elencadas algumas de suas características: 
• O prolongamento no tempo, pois o episódio esporádico não o caracteriza. • A intensidade da violência psicológica. 
• A intenção de ocasionar um dano psíquico ou moral ao empregado para marginalizá-lo no seu ambiente de trabalho. 
• A conversão, em patologia, em enfermidade que pressupõe diagnóstico clínico dos danos psíquicos. Revista Científica da Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman – Ano 1 – nº 1 – 2017/2018 | 87 
• A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos demais. 
• O assediador adota comportamento de Assédio Moral. A vítima apresenta sinais de ter sido atingida. O assediador persiste no Assédio Moral. A vítima apresenta prejuízos na saúde e nas funções. A vítima é afastada ou afasta-se. 
• A humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade, relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental.  


Situações de Assédio Moral no Ambiente de Trabalho (BARRETO, 2004) 
• Dar instruções confusas e imprecisas. 
• O bloqueio ao trabalho e a atribuição de erros imaginários. 
• Ignorar a presença de funcionário na frente de outros. 
• Solicitar trabalhos urgentes sem necessidade. 
• Solicitar ao trabalhador realizar tarefas abaixo de sua capacidade profissional. 
• Fazer comentários maldosos em público. 
• Não cumprimentar. 
• Impor horários injustificados ou forçar o trabalhador a pedir demissão. 
• Impedir o trabalhador de almoçar ou conversar com um colega. 


Consequências do Assédio Moral no Ambiente de Trabalho, Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (BRASIL, 2009, p. 26) 
• Queda da produtividade e menor eficiência. 
• Alteração na qualidade do serviço/produto e baixo índice de criatividade. 
• Imagem negativa da empresa perante os consumidores no mercado de trabalho. 
• Troca constante de empregados, implicando o acréscimo de despesas com rescisão, seleção e treinamento de pessoal. 
• Ações trabalhistas decorrentes das rescisões, inclusive com pedido de reparação de danos morais. • Acidente de trabalho, dano aos equipamentos e doenças profissionais. 


Esclarecimentos Úteis Quanto ao Assédio Moral 
• Uma única ofensa não caracteriza o Assédio Moral, o qual se tipifica por condutas abusivas, vexatórias e humilhantes, de forma repetitiva e prolongada no tempo. 
• O Assédio Moral é diferente do Assédio Sexual. Este último é uma conduta tipificada como crime no Código Penal e necessariamente tem como autor um superior hierárquico ou ascendente, visando a uma vantagem ou a um favorecimento sexual. O Assédio Moral, ao contrário, ainda não está tipificado como crime no Código Penal, bem como não visa obter uma vantagem sexual, e sim desestabilizar emocionalmente a vítima, a fim de que desista do emprego. 
• As vítimas apresentam alguns sintomas em comum, como crises de choro, insônia ou sono excessivo, dores de cabeça, tonturas, aumento da pressão arterial, dores generalizadas, sentimento de inutilidade, depressão etc. Em casos extremos, o assédio pode levar a vítima à tentativa de suicídio ou à morte. 
• É importante que a vítima anote todas as informações detalhadas do assédio, tais como: dia, hora, local, e, ainda, se alguém presenciou a cena. É importante que guarde eventuais provas escritas do assédio moral, ou seja, bilhetes com xingamentos, ofensas por escrito etc. Também é de extrema importância o depoimento de testemunhas que presenciaram as condutas do assediador ao longo do tempo. 
• O Assédio Moral pode ser praticado por qualquer colega de trabalho. Embora a situação mais comum seja a do Assédio Moral partir de um superior para um subordinado, muitas vezes pode ocorrer entre colegas de mesmo nível hierárquico, ou mesmo partir de subordinados para um superior, sendo este último caso, entretanto, mais difícil de se configurar. 
• É recomendável que a pessoa leve o caso ao conhecimento dos superiores hierárquicos do assediador e/ou aos Recursos Humanos do órgão, ou seja, a pessoa inicialmente deve tentar resolver o caso amigavelmente. Caso nenhuma atitude seja tomada pelo órgão no sentido de acabar com o constrangimento, a vítima deve procurar uma Ouvidoria para agilizar as providências cabíveis. 


OUVIDORIAS E O ASSÉDIO MORAL 
Qual seria o papel das Ouvidorias quanto ao enfrentamento das denúncias de Assédio Moral? As Ouvidorias possibilitam a intermediação entre o cidadão e a gestão do órgão, quando conseguem identificar ou não nas denúncias recebidas as características dos casos de Assédio Moral, esclarecendo devidamente o denunciante quanto aos procedimentos cabíveis. 
Elas fundamentam-se no tripé: qualidade, informação e controle, sendo um canal legítimo para coparticipação do cidadão na gestão. Neste sentido, o Ouvidor tem um desafio a superar no seu cotidiano profissional: interpretar fidedignamente os anseios dos cidadãos/usuários, mediar e conciliar os conflitos e cobrar das áreas responsáveis as possíveis soluções para o atendimento dessas demandas. 
Não é fácil formular uma denúncia de Assédio Moral em uma organização. O medo do funcionário de sofrer uma retaliação em decorrência de sua denúncia formulada, o descrédito quanto a uma necessária apuração por parte do próprio órgão, a dificuldade de reunir provas para uma possível apuração, assim como o receio das testemunhas em testemunhar são alguns fatores  que prejudicam o registro de manifestações sobre Assédio Moral nas Ouvidorias. Acrescente-se, ainda, o desconhecimento por parte das equipes das Ouvidorias quanto ao tema, o que dificulta as orientações necessárias aos trabalhadores de sua própria organização. 

Observa-se que, no banco de dados de uma Ouvidoria, é comum o assunto Assédio Moral ser desdobrado em vários outros, como: Má conduta do Gestor, Abuso Moral, Reclamação do atendimento etc. A tipificação do assunto requer clareza por parte da própria equipe, ao registrar a manifestação, considerando que a falta de informações precisas, a ausência de um maior detalhamento dos fatos e possíveis provas poderão levar ao arquivamento da própria denúncia formulada ou mesmo inviabilizar a instauração de um possível Processo Administrativo Disciplinar. 

Uma denúncia, ao ser registrada numa Ouvidoria, não deverá ser fundamentada pela “subjetividade”, ou seja, baseada apenas em sentimentos ou no próprio ponto de vista pessoal do denunciante, sendo a denúncia uma comunicação verbal ou escrita que indica irregularidade ou indício de irregularidade na administração e/ou no atendimento pela organização. O grau de prioridade de uma denúncia deverá sempre ser alto no seu banco de dados, surgindo a dificuldade não só do cumprimento de prazos por parte das áreas demandadas, como também a do próprio denunciado admitir que esteja praticando o Assédio Moral, quando ele envia à Ouvidoria respostas evasivas que sequer respondem ao teor da denúncia formulada. Não cabe à Ouvidoria emitir parecer sobre a veracidade ou não da denúncia formulada, mas sim a devida orientação sobre o tema e o necessário registro da denúncia para os procedimentos cabíveis. 
Quando a manifestação é encaminhada de forma anônima, por meio de e-mail ou mesmo de site, torna-se impossível à Ouvidoria entrar em contato com o denunciante. No atendimento presencial ou por meio do 0800 (quando este último existe), é possível à equipe técnica esclarecer ao denunciante as opções pelo anonimato, o sigilo ou a identificação da manifestação. Por não ser uma “resolvedoria”, a Ouvidoria terá um papel claro: intermediar junto à gestão a demanda encaminhada pelo cidadão, nesse caso o próprio servidor, e cobrar da área denunciada os procedimentos adotados e a necessária resposta ao denunciante. Portanto, a Ouvidoria não atua como correição (papel da Corregedoria) ou na fiscalização (ação peculiar ao Ministério Público), mas poderá subsidiar uma possível instauração de um Processo Administrativo Disciplinar, considerando-se que a denúncia foi registrada no seu banco de dados. Para tanto, o teor da manifestação deverá apresentar o detalhamento recomendável, contendo informações precisas e sujeitas a uma possível apuração por parte do próprio órgão. O papel da Ouvidoria é de fundamental importância quando, primando pela qualidade do atendimento, realiza os procedimentos técnicos de não apenas registrar, encaminhar e cobrar das áreas responsáveis a resposta devida, comunicando ao servidor as providências tomadas pelo órgão, mas também de levar ao conhecimento do gestor máximo, inclusive através de seus relatórios gerenciais (contendo um parecer técnico devidamente elaborado e fundamentando com dados estatísticos que retratam fidedignamente o seu banco de dados), a ocorrência ou mesmo reincidência da prática de Assédio Moral na organização. Neste sentido, a elaboração de relatórios gerenciais por parte da Ouvidoria fundamentará a análise técnica quanto à prática de Assédio Moral na organização, possibilitando inclusive subsidiar as áreas de Recursos Humanos e do próprio Planejamento da organização quanto às ações de prevenção ou mesmo de combate de tais práticas.  

A sistematização das informações e a sua análise qualitativa, através de relatórios gerenciais, possibilitarão à Ouvidoria, enquanto instrumento de gestão, dar visibilidade às medidas corretivas necessárias para que não haja reincidência sistemática de assuntos relativos à ineficiência da prestação de serviços, do atendimento realizado pela organização ou mesmo de irregularidades cometidas por gestores, servidores e/ou o atendimento e serviços que lhes foram prestados. Salienta-se, ainda, que a Ouvidoria não deverá ser a primeira instância de recebimento da denúncia de Assédio Moral. Recomenda-se que o assediado, em não conseguindo resolver a questão na esfera individual, faça o devido registro por escrito da denúncia e a encaminhe para uma chefia superior hierárquica ou para a área de Recursos Humanos de sua organização, a fim de se agilizarem as providências necessárias. O gestor máximo deverá estar ciente dessas denúncias, as quais poderão ser encaminhadas pela própria Ouvidoria à outra esfera de poder, quando constatada a sua ineficiência na necessária apuração da denúncia, podendo o próprio órgão vir a ser notificado judicialmente, o que poderá gerar desgastes para o próprio gestor máximo, além de possíveis indenizações vultosas. 

No Assédio Moral Organizacional, o propósito é atingir o trabalhador por meio de estratégias organizacionais de constrangimento, com o objetivo de melhorar a produtividade e reforçar o controle. Quando se pactuam metas inatingíveis, desconsiderando os limites de produtividade de suas próprias equipes, num clima absolutamente desumanizador, estabelecem-se as condições favoráveis à prática de Assédio Moral Organizacional. As denúncias não são devidamente apuradas pela organização, a qual prefere engavetá-las ou, no máximo, transferir a vítima de uma área para outra, sem que medidas eficazes sejam tomadas para combater a própria prática do Assédio e uma possível reincidência por parte do assediador. A vítima acaba sendo culpabilizada e estigmatizada pela organização. Acrescenta-se ainda a falta de investimento em capacitações no sentido de desenvolver habilidades humanas tão necessárias aos atuais gestores. Este cenário favorece a prática de Assédio Moral pela própria ineficiência do órgão no que diz respeito à prevenção ou combate de tais abusos, refletindo a fragilidade dos mecanismos de controle interno da própria gestão. 


CONSIDERAÇÕES 
As relações de trabalho nesta era “globalizada” caracterizam-se pela sua crescente desumanização. O ambiente de trabalho deveria proporcionar o desenvolvimento intelectual e um nível de satisfação crescente do trabalhador, o qual, estimulado pelas habilidades humanas de seus gestores, encontraria na organização os fatores motivacionais propícios ao atingimento de metas e realização profissional. Contudo, observa-se a degradação das relações de trabalho, sendo o Assédio Moral uma crescente tendência na atualidade. A prática do Assédio Moral é mais comum do que se supõe. Ela torna-se sutil, através de comentários indevidos, brincadeiras, atitudes e procedimentos que têm por objetivo denegrir a imagem profissional ou a trajetória que o trabalhador vem percorrendo na organização, desmoralizando-o diante dos demais colegas de trabalho, atingindo a sua autoestima e, consequentemente, impossibilitando-o de atingir as metas organizacionais. Quando se pactuam metas inatingíveis, considerando os limites de produtividade de suas próprias equipes, num clima absolutamente desumanizador, estabelecem-se as condições favoráveis à prática de Assédio Moral Organizacional. A Ouvidoria inserida neste contexto, enquanto canal constituído para intermediar as demandas dos seus cidadãos/usuários e a própria gestão, deverá realizar todos os procedimentos necessários no recebimento de denúncias de Assédio Moral, inclusive levando ao conhecimento do gestor máximo da organização a ocorrência ou mesmo reincidência dessas denúncias, as quais poderão ou não ser apuradas através de um Processo Administrativo Disciplinar pela organização. Através de seus Relatórios Gerenciais, possibilitará, inclusive, subsidiar as áreas de Recursos Humanos e do próprio Planejamento da organização quanto às ações de prevenção ou mesmo de combate a tais práticas. Torna-se urgente a necessidade de que o tema Assédio Moral seja amplamente discutido, bem como o próprio papel das Ouvidorias quanto às possibilidades e desafios no enfrentamento das denúncias de Assédio Moral no ambiente de trabalho. 

REFERÊNCIAS 
.BRASIL. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Assédio moral e sexual no trabalho. Brasília: MTE, ASCOM, 2009. p. 26. 
.BARRETO, Margarida Maria Silveira. Assédio moral: o risco invisível no mundo do trabalho. Disponível em: www. redesaude.org.br/jr25/html/body_jr25 -margarida.html. Acesso em: 10 jun. 2017. 
.CHIAVENATO, Idalberto. Administração: teoria, processo e prática. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. p. 69. ______. Assédio Moral: trabalho, doenças e morte em: Seminário Compreendendo o Assédio Moral no Ambiente de Trabalho, São Paulo, 2010, p. 18. Disponível em: www.assediomoral.ufsc.br/?page_id=41 6 Acesso em: 9 out. 2015. CURY, Augusto. Gestão da Emoção: técnicas de coaching emocional para gerenciar a ansiedade, melhorar o desempenho pessoal e profissional e conquistar mente livre e criativa. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 81. FLEURY, A.; .FLEURY, M. Estratégias empresariais e formação de competências: um quebra-cabeça caleidoscópico da indústria brasileira. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 185. 
.HIRIGOYEN, Marie France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. São Paulo: Ed. Bertrand do Brasil, 2002. PERNAMBUCO. Lei nº 13.314, de 15 de outubro de 2007. Disponível em: www.ouvidoria.pe.gov.br. Acesso em: 9 jul. 2017. 
______. 
.OUVIDORIA-GERAL DO ESTADO. Cartilha de assédio moral no ambiente de trabalho: prejuízos causados por condutas profissionais abusivas e vexatórias. Disponível em: www.ouvidoria.pe.gov.br. Acesso em: 01 jul. 2017. 
.RABAGLIO, Maria Odete. Gestão por competência: ferramentas para atração e captação de talentos humanos. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2008. p. 9.


Karla Júlia Marcelino: Graduação em Serviço Social. Foi instrutora do curso Implantação e Gestão de Ouvidoria no CEFOSPE e Gestão de Ouvidoria da Pós-Graduação na ESURP. Tem pós-graduação em Gestão Governamental (Fundação Getúlio Vargas), Gestão Pública e Serviços Sociais (UFPE) e Intervenção Psicossocial à Família no Judiciário (UFPE) e Psicologia Organizacional/NUPESF. Ministra palestras no Estado e área privada. Elaborou a Cartilha de Assédio Moral do Estado de PE. Implantou a Ouvidoria-Geral do Estado e a Rede de Ouvidores de PE. (karlajuliam@bol.com.br)
O PAPEL DAS OUVIDORIAS FRENTE AO ASSÉDIO MORAL 


*Karla Júlia Marcelino 
Maria do Rosário Lapenda 




Introdução 

Esse artigo tem por objetivo analisar o papel das Ouvidorias frente ao Assédio Moral. Para tanto fizemos uma revisão bibliográfica e trouxemos um estudo de caso. 
Nesta era globalizada, as Organizações enfrentam enormes desafios para que não haja a desumanização das relações de trabalho, quando metas pactuadas nem sempre estão em consonância com a capacidade de produção de suas equipes. 

Se não é fácil coadunar a lógica de resultados com um ambiente humanizado, a sociedade precisa que cada vez mais os Órgãos públicos funcionem melhor e prestem consequentemente serviços de qualidade.  

O ambiente de trabalho deveria proporcionar ao trabalhador as condições necessárias para o seu desenvolvimento moral e intelectual, possibilitando-lhe ampliar a sua visão de mundo, estimulando-o no desenvolvimento de qualidades humanas e o compartilhamento de conhecimentos imprescindíveis para a melhoria das relações de trabalho e o alcance dos resultados desejáveis. O Clima Organizacional reflete a atmosfera psicológica na qual os servidores compartilham e vivenciam experiências no cotidiano profissional e que influencia diretamente a motivação, a efetividade e compromisso desses trabalhadores. 

Segundo Rabaglio, (2008, p.8) “Gestão é o ato de gerir, de administrar. São os meios através dos quais se gerem uma equipe, uma instituição, um projeto, uma empresa”. Não bastam habilidades técnicas e conceituais, são necessárias também habilidades humanas a um gestor. Psicólogos especialistas em relacionamento humano destacam que: 
. Grande parte do nosso trabalho é feita por meio de contato com os outros, quer como indivíduos, quer como grupo. 
. A eficiência em lidar com outras pessoas é muitas vezes prejudicada pela falta de habilidades, de compreensão e de trato interpessoal. 
. As pessoas que têm mais habilidades em compreender os outros e têm habilidades interpessoais são mais eficazes no relacionamento humano. 

Infelizmente, percebe-se nitidamente a dificuldade de se relacionar em grupo numa sociedade capitalista e individualizada, cujos interesses imediatistas conflitam com os princípios de habilidades humanas. Embora o trabalhador seja o capital intelectual de uma organização, a sua importância está atrelada à sua capacidade de produção, e não a valores como lealdade, compromisso, solidariedade, fraternidade e humanidade. 

Na Cartilha de Assédio Moral publicada pela Ouvidoria Geral do Estado de Pernambuco (2011) consta que O assédio moral constitui um dos temas que mais têm sido discutidos na atualidade, no que se refere ao trabalho e ao trabalhador, comprometendo a dignidade, as suas relações afetivas e sociais. É importante considerar que o assédio moral apresenta contornos especiais no serviço público, em razão da garantia da estabilidade do vínculo funcional. 
A falta de clareza e discernimento quanto às situações vivenciadas no ambiente de trabalho que se configuram como assédio requer uma maior divulgação do tema e possível prevenção. Acrescente-se também o receio de possíveis retaliações ou perseguições por parte das vítimas quando elas denunciam a situação de assédio moral nas Ouvidorias. 

Em face da difusão dessa prática, é relevante que o tema seja discutido por toda a sociedade e, especialmente, pelos servidores públicos, constituindo-se as Ouvidorias num canal de intermediação desse processo. 1. O que é assédio moral? Estudos da Organização Internacional do Trabalho - OIT e da Organização Mundial da Saúde - OMS, realizados em países desenvolvidos, sinalizam que o assédio moral poderá se converter no principal problema do mundo globalizado, caracterizado como o "mal estar na globalização", atingindo o psicológico e emocional do cidadão, podendo desencadear ondas de depressão, angústia e outros danos psíquicos em expressivos segmentos de trabalhadores.

A OIT (2003) descreve o assédio moral como o comportamento de alguém para rebaixar uma ou mais pessoas através de meios vingativos, cruéis, maliciosos ou humilhantes. São críticas repetitivas e desqualificações, isolando-o do contato com o grupo, difundindo falsas informações sobre ele. Para a OMS, o assédio moral constitui o uso deliberado da força e do poder contra uma pessoa, grupo ou comunidade que cause ou tenha a possibilidade de causar lesões, morte, danos psicológicos, transtornos e privações. 

Segundo Margarida Barreto (2013) A reflexão sobre o assédio moral e a análise de várias situações diretamente relacionadas à organização do trabalho e à política de gestão demonstram que todo assédio moral é uma prática tanto institucionalizada, como organizacional. 

Na Lei de no. 13.314,de 15 de Outubro de 2007, que dispõe sobre a Lei de Assédio Moral no âmbito da Administração Pública Estadual Direta, Indireta e Fundações Públicas,em seu Art. 2º, “Considera-se prática de assédio moral, no âmbito da administração pública, toda ação repetitiva ou sistematizada praticada por agente e servidor de qualquer nível que, abusando da autoridade inerente às suas funções, venha causar danos à integridade psíquica ou física e à auto-estima do servidor, prejudicando também o serviço público prestado e a própria carreira do servidor público”. O cidadão poderá acessar a mencionada Lei no site da Ouvidoria Geral do Estado www.ouvidoria.pe.gov.br. 

Apesar de ter sido promulgada em 2007, a Lei de Assédio Moral ainda permanece desconhecida pelo conjunto de servidores públicos em Pernambuco, necessitando ser amplamente difundida em todo o Poder Executivo Estadual. 

Para se identificar um processo de Assédio Moral, elencaremos a seguir algumas de suas características: 
 A intensidade da violência psicológica. 
 O prolongamento no tempo, pois o episódio esporádico não o caracteriza. 
 A intenção de ocasionar um dano psíquico ou moral ao empregado para marginalizá-lo no seu ambiente de trabalho. 
 A conversão, em patologia, em enfermidade que pressupõe diagnóstico clínico dos danos psíquicos. 
 A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos demais. 
 Assediador adota comportamento de assédio moral. A vítima apresenta sinais de ter sido atingida. O assediador persiste no assédio moral. A vítima apresenta prejuízos na saúde e nas funções. A vítima é afastada ou afasta-se. 
 A humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade, relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental. 

Alguns dos objetivos do assediador na prática do Assédio Moral: 
 Desestabilizar emocional e profissionalmente o indivíduo; 
 Pressioná-lo a pedir demissão; 
 Provocar sua remoção para outo local de trabalho; 
 Fazer com que se sujeite passivamente a determinadas condições de humilhação e constrangimento, a más condições de trabalho. 

Situações de assédio moral no ambiente de trabalho*: 

 Dar instruções confusas e imprecisas. 
 O bloqueio ao trabalho e a atribuição de erros imaginários. 
 Ignorar a presença de funcionário na frente de outros. 
 Pedir trabalhos urgentes sem necessidade.  Mandar o trabalhador realizar tarefas abaixo de sua capacidade profissional. 
 Fazer comentários maldosos em público. 
 Não cumprimentar. 
 Impor horários injustificados ou forçar o trabalhador a pedir demissão. 
 Impedir o trabalhador de almoçar ou conversar com um colega. 
 Impor horários de trabalho injustificáveis ou mesmo forçar sua demissão. 


*Margarida Barreto- Assédio moral: o risco invisível no mundo do trabalho/2004. 


O Assédio somente ocorre entre Superior e Subordinado? Não. Embora a situação mais comum seja a do assédio moral partir de um superior para um subordinado, muitas vezes pode ocorrer entre: .Funcionários de uma mesma hierarquia.
 .Entre um subordinado (assediador) e um superior hierárquico (assediado). 
.Entre um grupo (assediador) e um indivíduo (assediado). 
.Um superior é agredido por subordinados. 

O que não é assédio moral no ambiente de trabalho: 

- Na condição de gestor, a exigência de produtividade, o cumprimento de metas e horários, o zelo pelas condutas éticas no ambiente de trabalho estão dentro das suas atribuições, considerando que a palavra gestor vem do latim gestore e de um modo geral os dicionários convergem para aquele que gere, dirige ou administra bens, negócios ou serviços. Considera-se servidor público, na condição de ofensor ou ofendido, abrangendo o titular de cargo efetivo ou comissionado e o empregado público. - - No Estresse O estresse profissional é comum na relação profissional, sobretudo quando é necessário atingir metas e resultados institucionais, desde que não cause constrangimentos ou humilhações injustificadas. 
- No conflito Teoricamente, cada um dos protagonistas pode defender sua posição. Já no assédio moral no ambiente de trabalho observa-se uma relação dominante/dominado, na qual aquele que comanda o jogo procura submeter o outro até fazê-lo perder a identidade. Quando isto se passa no âmbito de uma relação de subordinação, transforma-se em um abuso de poder hierárquico, e a autoridade legítima sobre um subordinado se torna a dominação da pessoa. 
- As más condições de trabalho: Trabalhar em um espaço exíguo, mal iluminado e sem estrutura não constitui um ato de assédio em si, salvo se um único funcionário for tratado especificamente assim ou se tais condições destinarem-se a desmerecê-lo. 
- As imposições profissionais: O assédio moral no trabalho é um abuso e não pode ser confundido com decisões legítimas que dizem respeito à organização do trabalho, como transferências e mudanças de função, no caso de estarem de acordo com o contrato de trabalho. Da mesma maneira, críticas construtivas e avaliações sobre o trabalho executado, contanto que sejam explicitadas, e não utilizadas com um propósito de represália, não constituem assédio, sendo natural que todo trabalho apresente um grau de imposição e dependência (HIRIGOYEN, 2002, p.34 e 35). 

Conseqüências do Assédio Moral no ambiente de trabalho, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE, 2013): 

 Queda da produtividade e menor eficiência; 
 Alteração na qualidade do serviço/produto e baixo índice de criatividade; 
 Imagem negativa da empresa perante os consumidores mercado de trabalho; 
 Troca constante de empregados implicando no acréscimo de despesas com rescisão, seleção e treinamento de pessoal; 
 Ações trabalhistas decorrentes das rescisões, inclusive, com pedido de reparação de danos morais;  Acidente de trabalho, dano aos equipamentos e doenças profissionais O que a vítima deve fazer? 
 Resistir: anotar com detalhes todas as humilhações sofridas (dia, mês, ano, hora, local ou setor, nome do agressor, colegas que testemunharam, conteúdo da conversa e o que mais você achar necessário). 
 Evitar conversar com o agressor, sem testemunhas. Sempre com colega de trabalho ou representante sindical. 
 O assediado deverá informar os fatos ocorridos por escrito, à sua chefia imediata ou ao superior hierárquico do ofensor, indicando, se houver, as testemunhas do ocorrido, para instauração do respectivo processo administrativo. 
  Exigir por escrito, explicações do ato agressor e permanecer com cópia de documento enviado ao D.P. ou R.H e da eventual resposta do agressor. 
 Recomenda-se também procurar o sindicato, assim como: Ministério Público, Justiça do Trabalho, Comissão de Direitos Humanos e Conselho Regional de Medicina (ver Resolução do Conselho Federal de Medicina n.1488/98 sobre saúde do trabalhador). 
 É importante buscar apoio junto a familiares, amigos e colegas, pois o afeto e a solidariedade são fundamentais para recuperação da auto-estima, dignidade, identidade e cidadania. Possíveis questionamentos. 
 Uma única ofensa não caracteriza o assédio moral o qual se tipifica por condutas abusivas,vexatórias e humilhantes de forma repetitiva e prolongada no tempo. 
 O assédio moral não é a mesma coisa que o assédio sexual. O assédio sexual é uma conduta tipificada como crime no Código Penal necessariamente tem como autor um superior hierárquico ou ascendente, visando uma vantagem ou favorecimento sexual. O assédio moral, ao contrário, ainda não está tipificado como crime no Código Penal, bem como, não visa obter uma vantagem sexual, mas sim, desestabilizar emocionalmente a vítima, a fim de que desista do emprego. 
 Existem alguns sintomas comuns nessas pessoas, como por exemplo: crises de choro, insônia ou sono excessivo, dores de cabeça, tonturas, aumento da pressão arterial, dores generalizadas, sentimento de inutilidade, depressão, etc. Em casos extremos pode levar a vitima à tentativa de suicídio ou à morte. 
 É importante que a vítima anote todas as atitudes do assediador tais como: dia, hora, local e se alguém presenciou a cena. É importante que guarde eventuais provas escritas do assédio moral, ou seja, bilhetes com xingamentos, ofensas por escrito, etc. Também é de extrema importância o depoimento de testemunhas que presenciaram as condutas do assediador ao longo do tempo. 
 O assédio moral pode ser praticado por qualquer colega de trabalho.Embora a situação mais comum seja a do assédio moral partir de um superior para um subordinado, muitas vezes pode ocorrer entre colegas de mesmo nível hierárquico ou mesmo partir de subordinados para um superior, sendo este último caso, entretanto, mais difícil de se configurar. 
 É recomendável que a pessoa leve o caso ao conhecimento dos superiores hierárquicos do assediador e/ou aos Recursos Humanos do Órgão, ou seja, a pessoa inicialmente deve tentar resolver o caso amigavelmente. Caso nenhuma atitude seja tomada pelo Órgão no sentido de acabar com o constrangimento, a vítima deve procurar uma Ouvidoria pública, para as providências cabíveis. 

Papel das Ouvidorias frente ao Assédio Moral: 

A seguir apresentaremos um case registrado na Ouvidoria de uma Organização: “Venho aqui denunciar a atitude do professor do ... que vem tendo comportamento desrespeitoso com a turma de Enfermagem do 2° período. Através de comentários maldosos e injuriosos sobre a profissão, o professor age com soberba e superioridade com os alunos. Primeiramente rebaixando os profissionais enfermeiros que usam o instrumento de trabalho estetoscópio afirmando não terem capacidade para isso, assim como o procedimento de anamnese, alegando ser também uma competência médica e que os profissionais de Enfermagem nunca seriam capazes de usar e aplicar esses instrumentos. Outro comentário foi a questão de afirmar na frente dos alunos que os enfermeiros nunca teriam capacidade de prescrever medicações, o que contrapõe a portaria de número 2.488 de 21 de outubro de 2011 que regulamento o profissional enfermeiro a prescrever medicações na Atenção Básica. Outro comentário foi o de que médico sem residência era um enfermeiro graduado, ou seja, nada. Outro comentário muito ofensivo foi o de comparação com a classe médica, ou seja, ora desmerecendo, afirmando coisas sem de fato conhecer o exercício profissional da mesma. Gostaria de que fosse tomada uma atitude no tocante a isso, pois esse professor está precisando de uma reciclagem. Numa academia, e nos dias de hoje não se pensa mais assim sobre a Enfermagem, que é pautada no rigor científico e intelectual, não se pode denegrir a imagem de uma classe, dos alunos e professores dessa forma!" 

Não é fácil para o servidor formular uma denúncia de Assédio Moral na sua organização. O medo em sofrer uma retaliação em decorrência de sua denúncia formulada, o descrédito quanto à uma necessária apuração por parte do próprio Órgão, a dificuldade em reunir provas para uma possível apuração, assim como o receio das testemunhas em testemunhar são alguns fatores que prejudicam o registro de manifestações sobre Assédio Moral. Acrescente-se ainda o desconhecimento por parte das equipes das Ouvidorias que dificultam as orientações necessárias aos trabalhadores de sua própria Organização. 

Observa-se que no banco de dados de uma Ouvidoria é comum o assunto Assédio Moral ser desdobrado em vários outros assuntos como Má conduta do Gestor, Abuso Moral, Reclamação do atendimento, etc. A tipificação do assunto requer clareza por parte da própria equipe ao registrar a manifestação, considerando que a falta de informações precisas, a ausência de um maior detalhamento dos fatos e possíveis provas poderá levar ao arquivamento da própria denúncia formulada. Uma denúncia ao ser registrada numa Ouvidoria não deverá ser fundamentada pela subjetividade, ou seja, baseada apenas em sentimentos ou no próprio ponto de vista pessoal, sendo a denúncia uma comunicação verbal ou escrita que indica irregularidade ou indício de irregularidade na administração e/ou no atendimento por entidade pública estadual. 

O grau de prioridade de uma denúncia deverá sempre ser alta no seu banco de dados, surgindo a dificuldade do cumprimento de prazos por parte das áreas demandadas, assim como o próprio denunciado admitir que esteja praticando o Assédio Moral. Não cabe à Ouvidoria emitir parecer sobre a veracidade ou não da denúncia formulada, mas sim a devida orientação sobre o tema e o necessário registro da denúncia. Quando a manifestação é encaminhada de forma anônima, através de e-mail ou mesmo do site, torna-se impossível à Ouvidoria entrar em contato com o denunciante. No atendimento presencial ou através do 0800 (quando este último existe) é possível à equipe técnica esclarecer ao denunciante as opções pelo anonimato, a sigilosidade ou a identificação da manifestação. 

Por não ser uma “resolvedoria”, a Ouvidoria terá um papel claro: intermediar junto à gestão a demanda encaminhada pelo cidadão, neste caso o próprio servidor, e cobrar da área denunciada os procedimentos adotados e a necessária resposta ao denunciante. Portanto, a Ouvidoria não atua como correição (papel da Corregedoria) ou na fiscalização (ação peculiar ao Ministério Público), mas poderá subsidiar uma possível instauração de um Processo Administrativo Disciplinar. Para tanto, o teor da manifestação deverá apresentar o detalhamento recomendável, contendo informações precisas e sujeitas a uma possível apuração. Salienta-se ainda que a Ouvidoria não deverá ser a primeira instância de recebimento da denúncia. 

Recomenda-se que o assediado, em não conseguindo resolver a questão do Assédio na esfera individual, faça o devido registro por escrito da denúncia e a encaminhe para uma chefia superior hierárquica ou para a área de Recursos Humanos de sua Organização para as providências necessárias. O gestor máximo deverá estar ciente, considerando que essa denúncia poderá ser encaminhada a outra esfera de Poder e o próprio Órgão vir a ser notificado judicialmente.  

Uma política de combate à prática de Assédio Moral na Organização: 
Recomenda-se ser preferível atuar a nível de prevenção do que combater uma prática já instalada no ambiente organizacional. Tornar o ambiente de trabalho mais humanizado, no qual o capital humano seja devidamente reconhecido em todos os níveis organizacionais é um premente desafio na atualidade. Neste sentido, uma ação intersetorializada envolvendo as diversas áreas com o objetivo de disseminar uma política de combate à prática de Assédio Moral propiciará a participação do conjunto de trabalhadores como agentes multiplicadores da referida política dentro da própria Organização. E a Ouvidoria, pela sua importância estratégica junto à gestão, propiciará relatórios gerenciais contendo dados estatísticos que darão maior visibilidade sobre a prática do Assédio Moral. 

Considerações Finais 
Disseminar o combate à prática do Assédio Moral na Organização possibilitará um ambiente de trabalho mais saudável e humanizado, no qual os trabalhadores possam alcançar resultados sem que tenham que vivenciar situações humilhantes/vexatórias,decorrentes de condutas abusivas por parte de chefias ou colegas de trabalho. As Ouvidorias exercem um papel estratégico na gestão quando possibilita estabelecer um canal de intermediação entre os servidores e a Organização, apresentando através de seus relatórios gerenciais dados estatísticos e parecer técnico quanto à reincidência da prática do Assédio Moral e outros assuntos diretamente relacionados à prestação dos serviços prestados pela Organização, bem como sugestões para a não reincidência de tais denúncias . 7. 

Referências Bibliográficas 
.Cartilha de Assédio Moral no ambiente de trabalho. Prejuízos causados por condutas profissionais abusivas e vexatórias. Disponível em www.ouvidoria.pe.gov.br. Acesso em 09.10.2015. 
.Chiavenato, Idalberto. Administração:teoria, processo e prática. 4ª Ed. Rio de Janeiro:Elsevier, 2007, p. 69 e 388. 
.Hirigoyen, Marie France, Mal-estar no trabalho:redefinindo o assédio moral. São Paulo: Ed.Bertrand do Brasil,2002. .Lei nº 13.314, de 15 de outubro de 2007. Disponível em www.ouvidoria.pe.gov.br. Acesso em 09.10.2015. 
.Margarida Barreto- Assédio moral: o risco invisível no mundo do trabalho/2004. 
.Rabaglio, Maria Odete.Gestão por competência: ferramentas para atração e captação de talentos humanos. Rio de Janeiro:Qualitymark, 2008, p.9. 
.Seminário Compreendendo o Assédio Moral no Ambiente de Trabalho. Ministério do Trabalho e Emprego (2010: São Paulo).Disponível em www.assediomoral.ufsc.br/?page_id=416. Acesso em 09.10.2015.
A mídia e os desafios de mercado em um mundo globalizado - O sistema de ouvidoria como diferencial no serviço público

. Karla Júlia Marcelino 
.Maria Helena C. Damasceno 

Palavras-chave: Capitalismo.Globalização.Descentralização.Neoliberalismo.Cidadania.Ouvidoria.Controle. Transparência.Comunicação. 

Resumo: Pretende-se, através deste artigo, relacionar o texto de Harvey David Condições Pós-moderna com o tema ouvidoria pública e os resultados da Pesquisa de Satisfação da rede de ouvidorias do Poder Executivo Estadual de Pernambuco, constituindo-se as ouvidorias num importante meio de comunicação entre os usuários dos serviços públicos e a gestão pública. 

Introdução 
Vários acontecimentos de importância histórica marcaram a civilização da humanidade. Mudanças, sucessivas transformações, influenciaram as dimensões político-econômica, social e principalmente o desenvolvimento das ciências. Neste contexto, estamos diante do desafio de discorrer sobre o tema, enfatizando aspectos embasadores do texto de Harvey David, Condições Pós-Moderna, uma pesquisa sobre as origens de mudanças culturais (6ª ed. São Paulo-Loyola, 1996) relacionando-os à atuação da Rede de Ouvidores do Poder Executivo Estadual de Pernambuco. Considerando que no cenário atual do Estado, o tema Ouvidoria pública vem sendo disseminado gradativamente junto aos servidores, gestores e cidadãos, constituindo-se numa prioridade de governo, é de grande relevância aprofundar a atuação das ouvidorias como instrumento de gestão, as quais poderão propor ações de melhoria aos órgãos públicos, para uma melhor prestação de serviços. A evolução do número de Ouvidorias públicas no Estado de Pernambuco demonstra o crescimento da consciência do cidadão na busca pela participação na administração pública. 
Este artigo apresentará no contexto do serviço público, os resultados da Pesquisa de Satisfação aplicada pela Rede de Ouvidorias do Estado de Pernambuco junto aos usuários dos seus serviços, no período de 25.06.2009 a 28.02.2010. Pretende-se analisar o grau de satisfação dos usuários quanto aos serviços que a atual Rede de Ouvidorias do Poder Executivo realiza, bem como medir o nível de eficiência desses serviços prestados. 

As ouvidorias surgem como fato inovador no processo de comunicação, sendo ferramenta estratégica de gestão, com fins de escuta estruturada para atender as demandas dos cidadãos. 

Segundo o autor Lyra (2009, p.83), (...) uma das principais – quiçá a mais importante – atribuição do ouvidor, diz respeito à sua atuação crítica e propositiva, voltada para a avaliação das orientações básicas que norteiam a instituição em que atua. Desse ponto de vista o ouvidor desfruta, sabidamente, de uma posição privilegiada. 
Nessa perspectiva, Elias salienta: E quais são as razões que explicam o protagonismo da ouvidoria? Ora, o constitucional princípio da eficiência e a cultura da reclamação, razão de ser da ouvidoria, consolidou uma aspiração social traduzida por uma nova postura cidadã, que exige o predomínio da gestão eficaz do bem público com a transparência e honestidade dos administradores e a colocação da administração a serviço do cidadão, através da criação de canais de comunicação que propiciem a ampliação da participação popular. Daí vem a legitimação do papel da ouvidoria que, ao operar com celeridade e eficácia, exercendo a real função de controle interno de uma instituição, permite reforçar a sua relação com a sociedade e especificamente com o cidadão que carece de direitos. 

Consequentemente, ao instituir uma ouvidoria, os organismos públicos ou privados demonstram essencial vontade de agir com eficiência contra as ações de má administração; contra os comportamentos abusivos e irracionais da burocracia; estimulando a transparência e a qualidade no atendimento e promovendo o adequado respeito ao cidadão (Oliveira, João Elias.Ouvidoria Pública Brasileira: A evolução de um modelo único). 

Desenvolvimento 
O século XX sedimentou movimentos significativos no desenvolvimento das ciências, no campo sociocultural, econômico e tecnológico, constituindo-se de três períodos evolutivos, em olhares diferentes: A visão mecânica, a visão econômica e a visão complexa. A visão mecânica foi predominante até meados do século XVII, época onde o comportamento das pessoas nas organizações foi fortemente influenciado pela segunda revolução industrial. A visão mecanicista se desenvolveu a partir dos conhecimentos das ciências exatas e da otimização da produção. Com o fascínio pela comprovação científica, baseada na manutenção, época do revolucionismo, determinismo, linearidade e monocausalidade, significando dizer que a visão do mundo é limitada ao que pode ser medido e comparado. São pensadores dessa visão de mundo a Ciência de Galileu e Descartes, a Mecânica de Newton e a Geometria de Euclides, além de outras teóricas. Essa visão mecanicista deu inicio à Administração como Ciências, que surge para atender a necessidade de organização das empresas industriais para o processo de produção, tempos do administrador americano Frederick Taylor, do Francês Henri Fayol e do Alemão Max Weber.  

Com a Revolução Industrial, o olhar econômico passou a ter predominância, o que durou até a segunda metade do século XX, exercendo influência nos dias atuais. Entende-se que a visão econômica é decorrente de propriedade e acumulação de riqueza e está presente na história desde que a humanidade deixou de ser nômade e passou a plantar e a criar. Foi reforçada com a Revolução Industrial, quando o capital passou a ser o mais importante fator de produção, em substituição à terra (recursos naturais) do período agropecuário. Essa visão, mais que predominante, foi hegemônica até a década de 70, quando se verificou o fim do chamado industrialismo, com o advento da globalização e da chamada “Era do Conhecimento”. As consequências gerais da visão econômica são: o mundo percebido como mercado; a prevalência das relações comerciais sobre as relações sociais; a realidade econômica, como realidade “objetiva” e os modelos de desenvolvimento com foco na demanda de mercado, pensamento linear, decisões de cima para baixo, entre outros mecanismos que resultavam na desumanização dos trabalhadores. Embora já ocorram evidências de um novo marco cultural, com visão complexa da realidade, observa-se que a visão econômica ainda influencia os modelos e práticas das organizações atualmente. 

Em seu artigo, Teorizando a Transição, Harvey David (1996) reflete sobre dilemas teóricos que estão sendo testemunhas nos dias de hoje. Destaca o teórico como Henry Ford, versando sobre a transição histórica do Fordismo, como modelo de produção em massa que revolucionou a indústria automobilística a partir de 1914 e a acumulação flexível, maneira encontrada pelo capitalismo para superar as crises frequentes e decorrentes contradições internas com a concentração do capital na mão da elite capitalista marcada pelo confronto direto com a rigidez do Fordismo. Refere-se também aos desafios resultantes dessa transição que atingiu o movimento conhecido como Keynesianismo, consolidado pelo teórico e economista inglês John Maymard. O Keynesianismo ficou também conhecido como “Estado de Bem-Estar Social”, ou “Estado Escandinavo”, que trazia políticas econômicas favoráveis ao trabalhador. Atribuía ao Estado o direito e o dever de conceder benefícios sociais que garantiam um padrão mínimo de vida, com a criação do salário mínimo, salário desemprego, redução da jornada de trabalho, etc. Pontuam-se ainda contribuições teóricas do Marxismo, como conjunto de idéias filosóficas, econômicas, políticas e sociais defendidas por Karl Marx e Friedrich Engels, posteriormente propagadas por outros seguidores. O Marxismo concebia o homem como ser social histórico, capaz de trabalhar, desenvolver produtividade no trabalho com suas potencialidades. 

O artigo de Harvey discorreu sobre a influência do capitalismo, sua expansão internacional, apresentando características essenciais em seu modo capitalista de produção, orientado para o crescimento, apoiado na exploração do trabalho vivo, com leis coercitivas, que impelem aos capitalistas inovações em sua busca de lucros. Refere-se aos contrastes do capitalismo organizado e o capitalismo desorganizado proposto por Lash e Urry. Vários marcos teóricos caracterizaram essa visão econômica no domínio dos mercados e controle de trabalho. Desde então a visão complexa ampliada com seu desenvolvimento cientifico se deu a partir do século XX, com múltiplas dimensões e funções interconectadas, sob os aspectos espacial, temporal, ecológico, social, econômico, político, institucional, ético e estético. 

Segundo o autor Perry Anderson (1995), (...) o neoliberalismo nasceu logo depois da 2ª guerra mundial, na região da Europa e da América do Norte, onde imperava o capitalismo. Foi uma reação teórica e política contra o Estado intervencionista e de bem estar. 5 Trata-se de um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado. Em 1973, o mundo capitalista entra numa longa e profunda recessão, cuja crise do modelo econômico combinava pela primeira vez baixas taxas de crescimento com altas taxas de inflação. Ao longo da década de 80, houve uma ampla difusão das propostas de corte neoliberal. O núcleo de propostas neoliberais para a América Latina, elaborados pelo Banco Mundial, enfatiza a necessidade de desregulamentação do Estado, propostas que passaram a ser conhecidas como “Consenso de Washington”. As sugestões, do ponto de vista social, eram no sentido de uma redução do gasto social, transferindo atividades e funções para o setor privado. Portanto, a redução do Estado torna-se a questão principal do projeto que nasce em outras esferas e é mediado pelos organismos financeiros internacionais. 

No Brasil, as organizações se proliferaram nas décadas de 70 e meados de 80, durante o regime autoritário, quando atores sociais lutavam pela defesa dos direitos de cidadania ou contra o autoritarismo vigente, embora com um alcance político limitado. A partir de então, algumas organizações da sociedade civil começaram a participar de redes de movimentos. 

A concepção de rede, segundo Warren (1993), (...) implica pensar, desde um ponto de vista epistemológico, na possibilidade de “integração de diversidade”. A análise em termos de redes de movimentos implica buscar as formas de articulação entre o local e o global, entre o particular e o universal, entre o uno e o diverso, nas interconexões das identidades dos atores com o pluralismo. O Estado nacional desenvolvimentista entra em crise, no início da década de 80, quando há uma crescente atuação do Governo Central no sentido de que se ampliasse a oferta de serviços no plano local. Em 1982, candidatos oposicionistas ganharam a eleição para governador nos principais Estados. A aprovação da Emenda Passos Porto (1983) possibilitou o aumento da participação dos governos subnacionais nos recursos tributários do país. Assim, o nosso sistema tributário foi gradativamente implementado até 1993. 

A partir da Constituição de 88, reduz-se a capacidade de atuação da União na área das políticas públicas, sendo incorporadas ao âmbito governamental, quando recursos que eram antes da União são repassados para Estados e Municípios. Contudo, com a descentralização, houve uma enorme multiplicação dos municípios, o que acarretou uma diminuição da receita, sem que fossem criadas novas formas de financiamento. Através das transferências intergovernamentais, a sociedade não controlou os gastos públicos locais; assim como o aumento da corrupção são apenas alguns efeitos perversos da descentralização. Contudo, apesar das profundas desigualdades econômicas regionais, das dificuldades administrativas e financeiras dos municípios, que levaria a uma competição predatória por recursos públicos e privados, culminando com a guerra fiscal entre Estados e no âmbito dos municípios, os consórcios intermunicipais tem possibilitado uma ação compartilhada/cooperativa na busca de solucionar problemas comuns, sendo um dos instrumentos dentro de uma rede de relações intergovernamentais. O êxito da municipalização depende do governo do Estado cumprir seu papel de “gestor regional”. A municipalização envolve, portanto, os três níveis de governo, sobretudo o do Estado. 

Na perspectiva do neoliberalismo, a crise que vivenciamos atualmente decorre da centralidade do Estado e a solução para resolvê-la será o mercado livre, no qual a sociedade moderna seria aquela da mobilidade social, ou seja, os homens seriam iguais do ponto de vista político/jurídico e seriam responsáveis pela sua ascensão material-financeira. A expansão tecnológica, a globalização e as novas práticas de gestão propiciaram elevação na 6 produtividade geral do mercado de trabalho brasileiro, conjuntamente com a influência de inúmeros setores do segmento organizacional na economia, contribuindo para a participação estatal no setor produtivo e o crescimento gradativo, desde a abertura comercial dos mercados. Esse cenário resultou excedente de mão-de-obra, com maior pressão para produtividade, gerando para a economia uma necessidade de melhoria no nível educacional da PEA (população economicamente ativa), embora os níveis salariais dos trabalhadores não correspondessem totalmente a essa melhoria de capacitação da mão-de-obra, visto que de forma geral, as empresas apenas substituíram os trabalhadores menos produtivos por trabalhadores mais produtivos e qualificados. Contudo, o desemprego de mão-de-obra mais capacitada foi mais elevado que para os demais trabalhadores com menor nível educacional, o que gerou um incremento na subutilização do potencial produtivo da mão-de-obra em setores menos produtivos ou até mesmo deslocandoos para o mercado de trabalho informal. 

O Federalismo no Brasil é resultante do padrão de competição não-cooperativa que predominava nas relações dos estados com a união e deles entre si”. O Governo Federal cobria os déficits dos bancos estaduais, os quais eram utilizados pelos governadores “como instrumento de atuação política, resultando em prejuízos para toda a nação. Durante o período de redemocratização, houve um significativo aumento de guerra fiscal, cuja concorrência entre os Estados elevou a desigualdade regional, complexificando a relação entre tributos e gastos públicos, afetando as finanças públicas estaduais, o equilíbrio fiscal e a efetividade dos programas descentralizados. 

De acordo com Jacobe (1990) a descentralização quer dizer: (...) possibilidade de ampliação para o exercício do direito do cidadão, autonomia da gestão municipal, a participação cotidiana do cidadão na gestão pública e uma potencialização de instrumentos adequados para o uso de uma redistribuição mais eficiente dos recursos. 

O termo descentralização tem sido frequentemente utilizado pelos políticos, administradores e cientistas sociais, que o aplicam em sentidos diferentes, conforme seus interesses. Portanto, o processo de descentralização é inevitável, haja vista a debilidade da União e os avanços experimentados pelo país no período de transição política. Em seus aspectos positivos, há argumentos favoráveis: a suposição de que quanto mais próximos os cidadãos estejam dos governantes, haveria mais informações para os cidadãos decidirem seus votos, assim como os cidadãos teriam uma maior participação não só no período das eleições, como também dos mandatos; haveria menor custo de transação, com menos níveis intermediários. Mas é preciso deixar claro que ela não possui qualidades exclusivamente positivas, uma vez que estudos realizados mostram o seu lado perverso, como a questão do populismo, clientelismo, corporativismo, assim como centralizações de atividades antes descentralizadas. 

A descentralização, ao invés de proporcionar o aumento dos recursos disponíveis, pode favorecer grupos políticos locais e ser regressiva na distribuição de recursos na medida em que a relação entre o poder político e a sociedade, o autoritarismo, os corporativismos sociais e territoriais e os interesses clientelistas se fizerem presentes. A desigualdade na distribuição de recursos entre as empresas, os Estados e seus municípios têm estimulado a competição quando se instala a guerra fiscal pela aquisição de novos complexos industriais. Vale salientar que a descentralização decorre do processo de crise das instituições públicas. 

Outrossim, a  descentralização pode ou não favorecer a democracia. Entre centralização e descentralização há o problema da coordenação, cabendo ao governo, em seus diferentes níveis, o trabalho de coordenação e mediação dos conflitos, evitar o uso da máquina do Estado para interesses particulares e incentivar: a criação de canais de participação da sociedade civil e o Poder Público, na formulação e monitoramento de políticas públicas; a construção de parcerias, processos associativos, negociações e o compartilhamento de decisões e responsabilidades; a cooperação nas relações intergovernamentais, através de redes federativas. É preciso, então, construir uma ética de defesa dos mínimos sociais necessários à vida digna dos brasileiros, avançar no reconhecimento dos direitos sociais dos excluídos, favorecendo mecanismos de participação na elaboração e controle dos resultados das políticas públicas. Há, portanto, de se construir a noção do bem público e de responsabilidade pública, que tenha como medida os direitos de todos, onde o princípio básico de igualdade esteja implícito à de cidadania, compreendida enquanto direito civil (sentido de pertencer ao Estado nação); político (o direito de viver democraticamente, participar do poder político) e social (direitos dos mínimos sociais à sua sobrevivência). 

Entenda-se por Accountability, a capacidade dos cidadãos, direta ou indiretamente, controlarem os governantes. Assim, o governo tem a obrigação de prestar contas à sociedade. A relação entre os eleitores e o governo se daria em dois momentos: nas eleições e entre as eleições (mandatos). As formas de responsabilização através dos controles são as seguintes: parlamentar – os parlamentares devem fiscalizar a lei orçamentária, podem controlar nomeações, comissões parlamentares de inquérito; procedimental – tem como base os procedimentos; judicial - controle autônomo de interpretação e de decisão; social – criação de canais e instrumentos a partir dos quais a sociedade possa controlar seus governantes; por resultados – baseados na nova gestão pública, com formas de avaliar diretamente a burocracia. 

A condição de cidadania implica no pleno exercício dos direitos e deveres reconhecidos pelo Estado, na qual o cidadão, além da garantia da participação democrática na formulação e implementação de políticas públicas, também participa do controle dos resultados alcançados pelos gestores e instituições públicas. 

Segundo Dalmo Dallari (1998,p.6): A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social. 

A Ouvidoria, na perspectiva de uma Administração Pública gerencial, tem como missão “assegurar o canal de manifestação e representação dos interesses dos cidadãos frente à administração pública, para a resolução ágil das questões apresentadas, promovendo a cidadania e a melhoria sustentada da gestão pública”. 

Compete à Ouvidoria Pública, encaminhar as manifestações pertinentes aos gestores e órgãos responsáveis pelas necessárias respostas ou mesmo medida corretiva quanto aos serviços públicos, atos ilícitos ou irregularidades administrativas, cobrando dessas mesmas áreas as respostas quanto às soluções devidas, para que não haja a reincidência dos assuntos das denúncias e reclamações relativas aos serviços prestados pelos gestores, informando-as aos cidadãos. Com base nessas informações oriundas das manifestações recebidas, o Ouvidor auxiliará a gestão, identificando os pontos fracos que necessitam de ações corretivas e propondo ações de melhoria. Assim, através das informações gerenciais que a Ouvidoria elabora, tendo por base as suas manifestações recebidas e registradas no banco de dados, ela atua enquanto instrumento de 8 gestão. 

Com a implantação de ouvidorias públicas, ampliam-se os mecanismos de controle social, que permite a transparência da gestão e a promoção da democracia, pois se constitui como um canal permanente de comunicação entre sociedade e governo. A evolução do número de Ouvidorias públicas no Estado de Pernambuco demonstra o crescimento da consciência do cidadão na busca pela participação na administração pública. 

Conforme nos diz João Elias: Hoje, a ouvidoria brasileira é, sem dúvida, um canal de diálogo com a população; uma porta aberta para a participação popular através do escutar da reivindicação e da reclamação; um celeiro de recomendações para a melhoria do serviço público; um espaço na esfera de respeito ao ser humano. 

O processo de comunicação representa um mecanismo de relevância para estabelecer canais de desenvolvimento em todos os segmentos culturais, sociais e tecnológicos. Comunicação, segundo Luiz Carlos Iasbeck,“é compartilhar sentimentos, temores, humores, angústias e surpresas, é estar junto, pertencer, vincular, estar afetado e em afeto com quem nos cerca”. O que se deu ao longo da história foi apenas mudanças de métodos, de grau de sofisticação e de aumento de opções na arte de comunicar-se. Mas a necessidade de comunicação é presente desde os primórdios da humanidade. É justamente nesse ponto que a civilização cultural cometeu equívocos em sua prática, promovendo meios de intensificar o investimento na diversidade de recursos tecnológicos, esquecendo a importância da criação de uma política com perspectiva estratégica de uma comunicação integrada, contemplando as habilidades do ser humano e os meios necessários para uma comunicação efetiva. 

A Política de Comunicação não seria apenas uma intenção que se manifesta, mas o compromisso que se assume, não vigora somente por discurso, mas pressupõem um trabalho sério, de construção coletiva, que começa numa decisão de cúpula da alta administração, devendo estar sempre alicerçada em várias necessidades reais (aumento da visibilidade organizacional na mídia, melhor relacionamento com as pessoas, consolidação da reputação, entre outros). Uma política de comunicação estrutura a relação que se estabelece no convívio social, servindo assim de pilares de sustentação para a efetividade organizacional. Portanto, a decisão política e técnica de implantar o sistema de Ouvidorias no Estado significou o reconhecimento legítimo do direito do cidadão em expressar sua opinião e de ser ouvido. 

Com a implantação de Ouvidorias, podemos identificar as seguintes vantagens: 
- Simplifica o acesso do cidadão-usuário às informações e serviços prestados pelas Organizações; - permite uma análise sistêmica da ocorrência dos problemas; 
- possibilita a implantação de soluções de forma integrada; 
- melhora a imagem da organização perante à sociedade. 

Assim, fundamenta-se a Ouvidoria no tripé: qualidade, informação e controle, sendo um canal legítimo para co-participação do cidadão na gestão da administração pública. 

Avaliar o impacto dessas demandas oriundas da população junto aos órgãos públicos, através da proposição de ações de melhoria para os gestores, constitui atualmente, uma das maiores atribuições das Ouvidorias públicas. Neste sentido, os ouvidores tem um desafio a superar no cotidiano institucional: interpretar fidedignamente os anseios dos cidadãos, mediar e conciliar os conflitos e cobrar das áreas responsáveis, as possíveis soluções para o atendimento dessas demandas.

 Disseminar a cultura da Ouvidoria no âmbito estadual constitui-se em poderoso instrumento para a transformação institucional permanente, favorecendo mudanças e ajustes em suas atividades e processos, em sintonia com as demandas da sociedade, ou seja, um caminho efetivo na busca da qualidade, transparência e da cidadania. 

Dentre as competências necessárias ao Ouvidor, as habilidades humanas são fundamentais para o desempenho de suas funções. Compreenda-se por habilidades humanas a capacidade de se comunicar, de compreender o comportamento humano e desenvolver uma liderança eficaz. No cotidiano do Ouvidor, ele lida com situações de angústias e conflitos, exercitando-se na arte de ouvir as pessoas e sobretudo, na condição de vivenciar a empatia. Empatia é a capacidade de se colocar no lugar da outra pessoa, de entender o seu estado de espírito. Em 2007, existiam apenas 23 ouvidorias públicas no Estado. 

A Ouvidoria Geral do Estado de Pernambuco foi oficializada em 14.10.2008, através do Decreto de n. 32.476 e tem por finalidade coordenar a rede de ouvidores públicos, através de um sistema integrado em rede, que possibilitará receber manifestações sobre o desempenho de órgãos e entidades do Poder Executivo, visando contribuir para o fortalecimento da cidadania e a melhoria da qualidade dos serviços prestados pelas instituições. Na época de sua oficialização, dentre as 28 Ouvidorias em funcionamento, 27 estavam interligadas pelo sistema de Ouvidoria, contendo um único banco de dados via WEB. 

Atualmente existem 53 Ouvidorias implantadas no Poder Executivo, dentre as quais 50 estão integradas ao Sistema de Ouvidoria do Estado e padronizadas nos seus principais processos, representando um aumento considerável de 126% de ouvidorias públicas. As redes interativas de computadores estão crescendo exponencialmente, criando novas formas e canais de comunicação, moldando a vida e, ao mesmo tempo, sendo moldadas por ela. Medir o grau de satisfação dos usuários dos serviços públicos quanto aos serviços que a atual Rede de Ouvidorias do Poder Executivo realiza é fundamental para o monitoramento e avaliação do nível de eficiência e efetividade desses mesmos serviços. 

A Pesquisa de Satisfação foi implantada no sistema de Ouvidoria do Estado em junho de 2009 e contém 6 questões do tipo fechada. É possível o cidadão/usuário respondê-la, através de e-mail ou por telefone, quando a manifestação é concluída. 

Nos Relatórios de Pesquisa de Satisfação junto aos usuários dos serviços das Ouvidorias, identificamos: 

 . Tipo de usuário dos serviços públicos- se é servidor do Estado ou não. 
 . A origem de informação a respeito da Ouvidoria: amigos, internet, órgão do governo, mídia ou panfleto. 
. Nível de satisfação do manifestante: insatisfatória, parcialmente satisfatória ou satisfatória. 
 . Papel da Ouvidoria: pouco importante, importante ou muito importante. 
. A eficiência da Ouvidoria – demorado, normal ou rápido . 
A reutilização da Ouvidoria – sim ou não. 

No período de 14.10.2008 a 28.02.2010, foram registradas 66.608 manifestações no sistema de Ouvidoria do Estado, com 57.477 manifestações concluídas, dentre as quais 10.806 pessoas responderam a Pesquisa de Satisfação, obtendo-se os seguintes resultados: 
. ESTATÍSTICA DE TIPO DE USUÁRIO : CIDADÃO- 74,7% SERVIDOR – 25,3% 2. 

ORIGEM DE INFORMAÇÃO A RESPEITO DA OUVIDORIA: 
.AMIGOS - 13,16% .
.INTERNET – 43,61% .
.ÓRGÃO DO GOVERNO – 18,72% 
.MÍDIA – 8,75%% .PANFLETOS – 15,74% 3. 

SATISFAÇÃO DO MANIFESTANTE:
.INSATISFATÓRIA - 8,95% 
. PARCIALMENTE SATISFATÓRIA - 24,19% 
.SATISFATÓRIA - 66,85% 

 PAPEL DA OUVIDORIA: 
.IMPORTANTE – 37,00% 
.MUITO IMPORTANTE - 61,76% 
.POUCO IMPORTANTE - 1,2% 

EFICIÊNCIA DA OUVIDORIA
DEMORADO - 12,32% 
NORMAL - 26,31% 
RÁPIDO - 61,35% 

REUTILIZAÇÃO DA OUVIDORIA 
NÃO - 2,87% 
SIM - 97,12% 

Esses resultados da Pesquisa refletem o nível de satisfação dos usuários quanto ao funcionamento da Rede de Ouvidorias atualmente existente. 
Destaca-se a necessidade de maior divulgação das Ouvidorias junto aos servidores públicos; a internet como o meio de exercício da cidadania on-line mais acessado pela população para conhecer esses serviços; considerável nível de satisfação dos usuários em relação aos serviços prestados; reconhecimento elevado quanto ao papel da Ouvidoria e o seu nível de eficiência; bem como elevado nível de reutilização dos serviços das Ouvidorias por parte dos cidadãos e usuários. 11 Conclusão 

Este artigo apresenta um estudo sobre a transformação político-econômica do capitalismo no final do século XX, com foco na comunicação corporativa/empresarial, adicionando o sistema de ouvidoria do Estado de Pernambuco como um demonstrativo de avanço tecnológico e valorização humana na gestão pública. Embora o assunto seja muito amplo, buscou-se fazer um apanhado geral, de forma sucinta, sobre os impactos da globalização no mercado de trabalho brasileiro e os desafios da mídia, conforme a literatura que embasou o presente estudo, destacando-se a implantação do serviço de ouvidoria no Estado de Pernambuco, como prática ilustrativa de um novo modelo de gestão. De uma maneira geral pode-se concluir que o impacto da globalização, juntamente com a nova revolução tecnológica, teve efeitos significativos na economia nacional inclusive no desenvolvimento das organizações, onde setores produtivos foram alterados por pressões da concorrência externa, privatizações e melhorias na qualidade de capacitação da mão-de-obra do país, além do investimento na geração de emprego e renda e a busca de sustentabilidade. 

A expansão tecnológica, a globalização e as novas práticas de gestão propiciaram elevação na produtividade geral do mercado de trabalho brasileiro, conjuntamente com a influência de inúmeros setores do segmento organizacional na economia, contribuindo para a participação estatal no setor produtivo e o crescimento gradativo, com a abertura comercial dos mercados. 

No fim do segundo milênio da era cristã, vários acontecimentos de importância histórica têm transformado o cenário social da vida humana. A revolução tecnológica concentrada na informação está remodelando a base material da sociedade em ritmo acelerado. Economias por todo o mundo passaram a manter interdependência global, apresentando uma nova forma de relação entre a economia, o estado e a sociedade em um sistema de geometria variável. O próprio capitalismo passa por um processo de profunda reestruturação caracterizado por maior flexibilidade, conforme texto Teorizando a Transição de Harvey David. Em conseqüência dessa revisão geral, ainda em curso, do sistema capitalista, testemunhamos a integração global dos mercados financeiros, a incorporação de preciosos segmentos de economias do mundo inteiro em um sistema interdependente que funciona como uma unidade em tempo real. Devido a essas tendências, houve também uma acentuação de um desenvolvimento desigual, desta vez não apenas entre o Norte e o Sul, mas entre os segmentos e territórios dinâmicos das sociedades em todos os lugares e aqueles que correm o risco de tornarem-se não pertinentes sob a perspectiva da lógica do sistema. Na verdade, observamos a liberação paralela de forças produtivas consideráveis da revolução informacional e a consolidação de buracos negros de miséria humana na economia global. Além disso, um novo sistema de comunicação que fala cada vez mais uma língua universal digital está promovendo a integração global da produção e distribuição de palavras, sons e imagens de nossa cultura como personalizando-os ao gosto das identidades e humores dos indivíduos. As novas tecnologias, formas de gestão e aumento de produtividade fizeram com que, num primeiro momento ocorresse uma elevação nos níveis de desemprego, porém, com a volta do crescimento da economia essa tendência está sendo revertida. Já na administração Pública, se forem avaliadas as oportunidades de contratação de mão-de-obra, enfrenta-se a 12 exigência de concurso público ou contratação temporária, onde o processo de capacitação e desenvolvimento é privilégio dos que pertencem ao quadro de servidores do Estado. 

O uso da máquina do Estado para interesses particulares reflete ainda a questão do patrimonialismo e clientelismo, enquanto práticas institucionalizadas muito arraigadas na nossa cultura. Não podemos falar que a gestão participativa tenha se tornado um paradigma hegemônico no nosso país. Se hoje direitos, cidadania, participação e negociação fazem parte da trajetória percorrida pela nossa sociedade, por outro lado, ela convive contraditoriamente com a concentração de renda, a desigualdade social, a exclusão social e a corrupção, tornando-se este quadro algo natural do nosso cotidiano, sem que nos cause indignação, enquanto opinião pública crítica. Por um lado, os pobres se tornam miseráveis e mais numerosos, os ricos ficam mais ricos e minoritários, refletindo a “apartação social” (Cristóvam Buarque) que reflete a exclusão social. A noção da nova cidadania deve ser capaz de incorporar dimensões da subjetividade, aspirações e desejos, em suma, interesses que através da luta política, consigam se generalizar como interesse coletivo e se constituir em direitos. 

Nos resultados das questões analisadas como objeto de pesquisa, no caso das ouvidorias, conforme apresentado nesse estudo, verifica-se uma perspectiva de melhoria significativa no tratamento dispensado aos cidadãos-servidores. E com a proliferação de ouvidorias no país e especialmente a consolidação da Rede de Ouvidores em Pernambuco, torna-se mais eficaz o processo de intercâmbio e comunicação entre os cidadãos usuários e o Estado, possibilitando uma maior transparência e prestação de contas dos seus resultados e devida avaliação quanto ao nível de satisfação desses usuários em relação à gestão pública, através da Pesquisa de Satisfação, cujos resultados são enviados nos relatórios gerenciais ao governador do Estado e Secretários mensalmente pela Ouvidoria Geral do Estado.  


Referências 
.DALLARI, Dalmo. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998. p.14. 
.FERNANDO, Luiz Abrucio; Miranda, Márcia. Redes Federativas no Brasil Cooperação Intermunicipal no Grande ABC. Fundação Konrad Adenauer. 
.HARVEY, David,Condição Pós – Moderna. 6° Edição Loyola, São Paulo Brasil,1996. LYRA, Rubens Pinto. Modalidades de ouvidoria pública no Brasil (org. e co-autor) João Pessoa: Ed. UFPB, 2009. 
.LYRA, Rubens Pinto. Participação e Segurança Pública no Brasil: teoria e prática.Participação e segurança pública no Brasil; teoria e prática.João pessoa:Editora Universitária da UFPB, 2009. .NUNES, Edson. Poder Local, Descentralização e Democratização: Um Encontro Difícil. In:São Paulo em Perspectiva. São Paulo:Fundação SEADE,vol. 10, número 03. Julho/Setembro,1996. .OLIVEIRA, João Elias.Ouvidoria Pública Brasileira: A evolução de um modelo único, publicado no site da ABO Nacional. PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Cadernos MARE da Reforma do Estado. Brasília- DF.1997. 
.Pernambuco. Secretaria Especial de Articulação Social do Estado de. Projeto de Implantação da Ouvidoria Geral do Estado de Pernambuco. Pernambuco, Abril 2007 p. 6. 
.SADER, Emir; GENTILI, Pablo. Pós Neoliberalismo: As políticas Sociais e o Estado Democrático. RJ: Paz e Terra, 1995. 
.WARREN, Ilse Scherer. Redes de Movimentos Sociais. São Paulo: Edição Loyola,Brasil,1993.

Karla Júlia Marcelino: Graduação em Serviço Social. Foi instrutora do curso Implantação e Gestão de Ouvidoria no CEFOSPE e Gestão de Ouvidoria da Pós-Graduação na ESURP. Tem pós-graduação em Gestão Governamental (Fundação Getúlio Vargas), Gestão Pública e Serviços Sociais (UFPE) e Intervenção Psicossocial à Família no Judiciário (UFPE) e Psicologia Organizacional/NUPESF. Ministra palestras no Estado e área privada. Elaborou a Cartilha de Assédio Moral do Estado de PE. Implantou a Ouvidoria-Geral do Estado e a Rede de Ouvidores de PE. (karlajuliam@bol.com.br)
A EDUCAÇÃO DOS SENTIMENTOS E O DESENVOLVIMENTO DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL 


*Karla Júlia Marcelino 


RESUMO 

A compreensão do significado dos sentimentos, através do auto-conhecimento, identificando como eles se manifestam no ser, torna-se um passo imprescindível para a mudança comportamental e consequente melhoria das relações intra e interpessoais. Os nossos pensamentos, sentimentos, palavras, ações refletem as crenças, valores, visão de mundo internalizadas através da educação. A identificação de sentimentos que geram estados de sofrimentos possibilitará alcançar uma maior compreensão quanto às suas causas e consequências. Através da educação dos sentimentos e o desenvolvimento da inteligência emocional, estaremos alcançando o equilíbrio entre o pensar, sentir e agir e conseqüentemente, melhorando as nossas relações humanas e profissionais. 

Palavras-chave: Educação. Sentimentos. Inteligência Emocional. Conhecimento. Competências. 

1. Introdução 

Estamos diante de um mundo globalizado e competitivo, em constantes transformações. As organizações enfrentam desafios de ordem econômico-social, política e financeira, onde os dirigentes, gestores e líderes organizacionais se deparam com novos conceitos e metodologias, inovação tecnológica, numa velocidade acelerada que, quando começam a ser processadas, os paradigmas já se alteraram. A internet facilitou o acesso às informações, o que antes era privilégio de poucos e podemos falar da era virtual vivenciada naturalmente por milhões de criaturas. Contudo, ainda somos os grandes desconhecidos de nós próprios. Os sentimentos, emoções, pensamentos, atrações, repulsas, simpatias e antipatias manifestam-se ainda de forma incompreensível e sem controle, dificultando as relações intra e interpessoais. Os erros alheios são visíveis aos nossos olhos, contudo, e os nossos defeitos e tendências negativas, são devidamente observadas por nós? A palavra educação vem do latim “educare ou educere. Provérbio: e, verbo ducare, ducere. Significa ato de educar; conjunto de normas pedagógicas aplicadas ao desenvolvimento geral do corpo e do espírito. Promover educação; transmitir conhecimentos; ensejar condições para o educando modificar para melhor” (Dicionário Aurélio). 

 Kardec, eminente pedagogo francês (1857) nos esclarece que: “A educação, se for bem compreendida, será a chave do progresso moral. Quando se conhecer a arte de manejar os caracteres como se conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas. Essa arte, porém, exige muito tato, muita experiência e profunda observação”. 

Na Wikipedia (2010), encontramos uma definição de Sentimentos: de forma genérica são informações que seres biológicos são capazes de sentir nas situações que vivenciam. 

Abraham Maslow, professor de Harvard comentou que todos os seres humanos nascem com um senso nato de valores pessoais positivos e negativos. Somos atraídos por valores pessoais positivos tais como justiça, honestidade, verdade (...). Atualmente o termo sentimento é também muito usado para designar uma disposição mental, ou de propósito, de uma pessoa para outra ou para algo. Os sentimentos assim, seriam ações decorrentes de decisões tomadas por uma pessoa. Geralmente confunde-se sentimentos com emoções. Sentimentos são estados afetivos produzidos por diversos fenômenos da vida intelectual ou moral. De forma geral, pode-se afirmar que os sentimentos são duradouros e fáceis de esconder; já as emoções, por serem corporais e espontâneas, são mais visíveis (mãos suadas, choro, riso...). 

Como nos explica Jolivet (1964, p.73) “emoção é um fenômeno afetivo complexo, provocado por um choque brusco e compreendendo um abalo mais ou menos profundo na consciência”. 

C. LAHR (1964) também explica que emoção é o estado afetivo intenso muito complexo proveniente da reação ao mesmo tempo mental e orgânico do indivíduo todo, sob a influência de certas excitações internas ou externas, pois, nisto se vê a diferença existente com o termo sentimento. Inteligência emocional é um conceito em Psicologia que descreve a capacidade de reconhecer os próprios sentimentos e os dos outros, assim como a capacidade de lidar com eles.

 Goleman definiu inteligência emocional como: "...capacidade de identificar os nossos próprios sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e de gerir bem as emoções dentro de nós e nos nossos relacionamentos" (1998). Para aquele autor, a inteligência emocional é a maior responsável pelo sucesso ou insucesso dos indivíduos. Como exemplo, recorda que a maioria das situações de trabalho é envolvida por relacionamentos interpessoais, desse modo, pessoas com qualidades de relacionamento humano, como afabilidade, compreensão e gentileza têm mais chances de obter o sucesso. 

Assim, a inteligência emocional pode ser categorizada em cinco habilidades: 
.Auto-Conhecimento Emocional - reconhecer as próprias emoções e sentimentos quando ocorrem. .Controle Emocional - lidar com os próprios sentimentos, adequando-os à cada situação vivida. .Auto-Motivação - dirigir as emoções à serviço de um objetivo ou realização pessoal. .Reconhecimento de emoções em outras pessoas - reconhecer emoções no outro e empatia de sentimentos; e 
.Habilidade em relacionamentos inter-pessoais - interação com outros indivíduos utilizando competências sociais. 

Enquanto nos comprazemos nas paixões, reincidindo nos erros, numa atitude desatenta quanto aos aspectos que necessitam serem modificados ou burlados na nossa intimidade, enfrentaremos angústias e conflitos existenciais. As oportunidades do aprendizado na convivência com o próximo e consigo mesmo não devem ser desperdiçadas. 

Para Eugênio Mussak (2003, p. 62-65), Conhecimento é informação com significado, capaz de criar movimento, modificar fatos, encontrar caminhos, construir utilidade (...). Conhecimento é algo pessoal, propriedade de quem o detém, e não pode ser transferido de uma pessoa a outra por inteiro, com todas as suas características, sentimentos, detalhes e significados. 

Os nossos pensamentos, sentimentos, palavras, ações refletem as crenças, valores, visão de mundo internalizadas através da educação. A identificação de sentimentos que geram estados de sofrimentos possibilitará alcançar uma maior compreensão quanto às suas causas e consequências. 

Relacionaremos a seguir, conforme Ney Prieto Peres (1991, p.77 a 109), alguns dos sentimentos negativos de conotação “perturbadora”: orgulho, vaidade, inveja, ciúme, avareza, ódio, remorso, vingança, agressividade, personalismo, maledicência, intolerância, impaciência, negligência e ociosidade. 
Ouvir significa ter paciência e tolerância para aceitar a outra pessoa como ela é, com suas qualidades e defeitos, crenças e emoções, sem pré-julgamentos. Conforme nos diz Penha “Ouvir é mais que uma atitude de educação, é sinônimo de inteligência, porque em geral, as pessoas têm sempre algo importante a nos dizer, que às vezes pode fazer toda a diferença no nosso próprio trabalho “ (2008, 93). 

2. Gestão por Competências Segundo RABAGLIO (2008, p.9), Gestão é o ato de gerir, de administrar. São os meios através dos quais se gerem uma equipe, uma instituição, um projeto ou uma empresa. A gestão por Competência, segundo a mesma autora, está baseada numa tríade conhecida como CHA, compreendendo os conhecimentos, as habilidades e as atitudes de uma pessoa. O conhecimento tem relação com a formação acadêmica, informações recebidas e o investimento na vida profissional. A habilidade está ligada ao prático, à vivência e ao domínio do conhecimento. Já a atitude representa as emoções, os valores e sentimentos das pessoas, que compreende o comportamento humano. A palavra gestor vem do latim gestore e de um modo geral os dicionários convergem para aquele que gere, dirige ou administra bens, negócios ou serviços. Chiavenato (2007) coloca que para alcançar resultados o gestor precisa desenvolver competências fundamentais: conhecimento, habilidades, julgamento e atitude. E as competências fundamentam-se em habilidades necessárias a um gestor: 

Habilidades técnicas consiste em utilizar conhecimentos, métodos, técnicas e equipamentos necessários para a realização de tarefas específicas com base em seus conhecimentos e experiência profissional. [...] As habilidades humanas: consistem na capacidade e no discernimento para trabalhar com pessoas e, por intermédio delas, saber comunicar, compreender suas atitudes, motivações e desenvolver uma liderança eficaz. [...] as habilidades conceituais: consistem na capacidade de lidar com idéias e conceitos abstratos. Essa habilidade permite que o administrador faça abstrações e desenvolva filosofias, valores e princípios de ação (2007, p.69). Para o mesmo autor, as competências pessoais transformam pessoas em talentos” (CHIAVENATO, 2007, p. 388). 

Com a padronização dos sistemas de gestão, as empresas desenvolveram capacidade suficiente para operar de maneira produtiva nesse processo de gestão por competências, garantindo assim um bom posicionamento no mercado competitivo, agregando valores, pela modernidade e efetividade de seu embasamento técnico, teórico e prático. 

4. Considerações 

O conhece-te a ti mesmo, conforme nos ensinou um sábio da antiguidade (Sócrates), será o meio mais prático de transformação interior. Quando por livre e espontânea vontade, não nos dispomos a enveredar neste processo de auto-conhecimento, buscando identificar o porquê das nossas reações negativas aos fatores externos no relacionamento social, somos impulsionados pelos entre-choques afetivos com aqueles do nosso convívio (família, trabalho, grupos sociais) a nos conhecer. Aprendemos muito na convivência, através de nossas reações com o meio e as manifestações que o meio nos provoca, atingindo-nos emocionalmente. No convívio com o próximo, aprendemos a identificar nossas reações indesejáveis de comportamento e a discipliná-las. O conhecer-se é o próprio processo de auto-conscientização do reconhecimento de nossas limitações e da mobilização de esforços em superá-las. No relacionamento humano, a eficiência em lidar com outras pessoas é muitas vezes prejudicada pela falta de habilidades, de compreensão e de trato interpessoal. As pessoas que têm mais habilidades em compreender os outros e têm traquejo interpessoal são mais eficazes no relacionamento humano. Assim, através da educação dos nossos próprios sentimentos e do desenvolvimento da inteligência emocional, estaremos alcançando o equilíbrio entre o pensar, sentir e agir e conseqüentemente, melhorando as nossas relações humanas e profissionais. 

Referências 
. CHIAVENATO, Idalberto. Administração: teoria, processo e prática. 4. Ed. Rio de Janeiro:Elsevier, 2007, p.69 e 388. 
. GOLEMAN, Daniel. Emotional intelligence. New York: Bantam Books, 1995. 
. JOLIVET, Régis. In: FONTANA, D. F. Filosofia do Vestibular. São Paulo, Saraiva, 1964, p. 73. 
. Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos: Filosofia Espiritualista. São Paulo, 51 º Edição,Lake, 1991. 
. LAHR, C. In: FONTANA, D. F. Filosofia do Vestibular. São Paulo, 1964, p. 70. 
. Mussak, Eugenio. Metacompetência:Uma nova visão do trabalho e da realização pessoal.são Paulo:Editora /gente, 2003, p.62,65. 
 . PENHA, Cícero Domingos.Atitude é querer:como a atitude faz a diferença na carreira, nos negócios e na vida.Rio de Janeiro:Qualitymark, 2008, p.93. 
.PERES, Ney Prieto. Manual prático do Espírita. São Paulo:Editora Pensamento, 1990, p.78 a 109. 
.RABAGLIO, Maria Odete. Gestão por Competência: ferramentas para atração e captação de talentos humanos. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2008 p.9. 
.Wikipedia. Disponível em; em HTTP://pt.wikipedia.org/wiki/sentimento.Acesso em: 21 de set.2010


Karla Júlia Marcelino: Graduação em Serviço Social. Foi instrutora do curso Implantação e Gestão de Ouvidoria no CEFOSPE e Gestão de Ouvidoria da Pós-Graduação na ESURP. Tem pós-graduação em Gestão Governamental (Fundação Getúlio Vargas), Gestão Pública e Serviços Sociais (UFPE) e Intervenção Psicossocial à Família no Judiciário (UFPE) e Psicologia Organizacional/NUPESF. Ministra palestras no Estado e área privada. Elaborou a Cartilha de Assédio Moral do Estado de PE. Implantou a Ouvidoria-Geral do Estado e a Rede de Ouvidores de PE. (karlajuliam@bol.com.br)